Opinião

A questão do Serviço Nacional de Saúde

4 jul 2022 15:45

O problema do SNS não é conjuntural, mas estrutural

Não sou especialista em saúde, mas apenas um cidadão que acompanha perplexo e preocupado o que está a acontecer com o SNS, uma das melhores realizações da democracia portuguesa e das que mais contribuiu para a melhoria da qualidade de vida dos portugueses.

Nos últimos anos, a partir da troika, assistimos a uma degradação do SNS com todos os governos a terem culpas no cartório.

O SNS, cuja existência é um imperativo constitucional, diminui e o sector privado cresce, muitas vezes à custa do Estado através de convenções e subsistemas.

Não podemos culpar o sector privado pela situação, mas o Estado que não soube responder às necessidades da população.

No entanto, e de acordo com o Observatório Português de Saúde, nos últimos seis anos foram admitidos mais 30.000 profissionais para o SNS e, surpreendentemente ou talvez não, a produtividade desceu 25%, ou seja, o número da actos médicos diminuiu 25%.

Uma das razões poderá radicar na diminuição da carga horária semanal de 40 para 35 horas.

Outra razão radicará no absentismo que aumentou 12% o que é um mau sintoma.

A concorrência do sector privado é, igualmente, uma razão para a drenagem do pessoal do SNS, bem como o negócio da prestação de serviços.

Seja qual for a razão, não restam dúvidas que os profissionais do SNS não se sentem felizes no seu trabalho e, actualmente, a compensação financeira nem sempre é a razão principal para reter as pessoas em qualquer organização, embora não se compreenda bem que, nos últimos dez anos e segundo o jornal Diário de Notícias, o aumento médio dos salários na função pública, tendo sido de 13,1%, para certas classes profissionais como magistrados, polícias, enfermeiros, deputados e outros, esse aumento salarial foi acima dessa média e, para os médicos e investigadores, foi abaixo da mesma!

Em conclusão, o problema do SNS não é conjuntural, mas estrutural.

Não é possível gerir de forma centralizada uma organização com a dimensão e complexidade do SNS.

Em breve, será discutido em Conselho de Ministros o Estatuto do SNS, dando seguimento à Lei de Bases da Saúde.

Nesse estatuto está prevista a criação de uma direcção executiva do SNS separada do Ministério da Saúde e liderada por uma figura equivalente ao “CEO” das grandes empresas à qual competirá a gestão e articulação dos recursos do SNS.

Os objectivos já enunciados passam pela reforma dos cuidados de saúde primários, reforma dos cuidados de saúde mental e reforma do modelo de governação dos hospitais públicos.

Outras apostas serão na medicina de proximidade e nos cuidados continuados com o objectivo de diminuir a pressão nas urgências hospitalares.

Acrescentaria a digitalização da saúde, prevista no PRR, os “hospitais em casa” com o consequente apoio e compensação aos cuidadores/familiares e a criação de Sistemas Locais de Saúde.