Opinião
David e Golias
O que explica que as grandes empresas falhem estas novas hipóteses geradas por novas tecnologias?
A teoria da inovação diz-nos que, tendo em conta os ciclos de vida das tecnologias, os mercados tendem a assistir a uma oscilação entre a importância para a geração de inovação dos pequenos empreendedores versus as grandes empresas e os seus enormes laboratórios de I&D.
Quando uma nova tecnologia nasce existem hipóteses para pequenos empreendedores, que apostam na inovação de produto, exploratória e arquitetural (no início do século XX a Europa contava com largas centenas de fabricantes de automóveis, no final dos anos 70 e princípio dos anos 80 existiam centenas de empresas que apostavam em novos desenhos de microcomputadores e sistemas operativos).
Muitas vezes, as empresas incumbentes ignoram essas tecnologias emergentes, porque estão concentradas em servir vastos segmentos de mercado rentáveis, com tecnologias e produtos estabelecidos (isto explica porque os construtores de automóveis ignoraram o nascente nicho de carros elétricos, que foi ocupado pela pequena Tesla, há cerca 15 anos, quando lançou o seu Roadster). Este fenómeno foi cunhado pelo professor Clayton M. Christensen como o “Dilema do Inovador”.
À medida que mercado e tecnologia amadurecem, a inovação deixa de ser exploratória e passa a existir o estabelecimento de um design dominante (no setor automóvel há 115 anos o Ford modelo T, no caso dos computadores o IBM-PC, e atualmente no setor dos automóveis elétricos o modelo S/3 da Tesla).
Quando isto acontece, as empresas deixam de se focar em pequenos nichos de utilizadores iniciais e concentram-se na maioria do mercado, a inovação passa a estar a ser centrada em processos (produzir mais barato e melhor) e muitas empresas desaparecem. As hipóteses dos “pequenos” empreendedores (“numa garagem”, como Bill Gates ou Steve Jobs no início dos anos 1980) desaparecem.
O que explica que as grandes empresas falhem estas novas hipóteses geradas por novas tecnologias? (Por exemplo, a Kodak inventou a fotografia digital, mas foi incapaz de desenvolver competências nessa área).
Possivelmente a inflexibilidade, a burocracia, a necessidade de servir os clientes atuais, o investimento em processos antigos e a falta de capacidade de aprender novas “coisas” (tudo fatores que as pequenas empresas trabalham melhor).
Mas serve esta crónica para refletir que talvez o mundo atual, demasiado concentrado em poucas empresas, com problemas de regulação eficaz (o livre funcionamento, ao contrário das teorias mais liberais, tem levado a oligopólios), está a impedir o triunfo dos pequenos em novas ondas tecnológicas.
O domínio da Microsoft ou Apple, constante, e o alargar dos seus monopólios a diversas áreas (do streaming à IA) não é positivo. Tal como não é positivo para novas regiões poderem fazer catching-up económico (como Portugal).
Veremos, assim, se o futuro trará novos David para enfrentar os Golias dos nossos tempos empresariais.