Opinião
Letras | Entre Sílabas e Lavas, Nuno Guimarães
Um autor de certa forma subversivo, e que levava a palavra ser larga na poesia, muitas vezes amordaçada e desconfortavelmente agrilhoada entre métricas
José Nuno Guimarães Guedes dos Santos nasceu em Vila Nova de Gaia, em 29 de Agosto de 1942. Formou-se em Filologia Românica pela Faculdade de Letras de Coimbra e foi docente em Angola após serviço militar. No regresso a Portugal, prossegue a sua actividade como professor e em 1970 publica o seu primeiro livro Corpo Agrário para depois em 1973 lançar o seu segundo livro Os Campos Visuais.
Parte muito cedo, com pouco mais de 30 anos, em 15 de Agosto do mesmo ano. Nesta edição reúnem-se integralmente os dois livros e alguns dispersos, que se considerou serem consonantes com a alma de ambos as obras.
Um autor de certa forma subversivo, e que levava a palavra ser larga na poesia, muitas vezes amordaçada e desconfortavelmente agrilhoada entre métricas. Deu conteúdo com as formas da natureza e da humanidade. O campo, tudo o quanto é bucólico poderia ser cantado, o amor e o sexo num plano além da ditadura dos costumes.
“Mas sabe o construtor como sustenta/ as dimensões. Como exigir os planos/ mais cegos: debruçar-se no vento, reflectir/ múltiplos actos, a erosão e anarquia/ das linhas. A atmosfera em poços.”
“Abriram a vagina: a mãe, o sol, / as regiões inexpugnáveis. Quem organiza/ este desejo? Centrada sobre as árvores, / a derradeira luz. Nos troncos, a erecção [...] onde cresceu a própria língua, / destruídos, nas paredes, os ramos, / a terra, da sóbria palidez/ as folhas – a erecção visível.”
A criatividade em deixar partes de palavra para a linha abaixo do verso ou do verso seguinte, criava a segunda palavra – um duplo sentido, ou a magnitude do mesmo. A busca da semântica aberta, pela possibilidade de se criar no poema uma leitura fraccionada, pela disseminação das palavras. Abrir novos caminhos, na liberdade do ser e do sentir. “por onde a/ vida, a letra, a lite- / ratura se consomem.”