Opinião

Nunca mais é Natal

18 abr 2019 00:00

Esteve treze meses internado na ala psiquiátrica de um hospital quando regressou a Portugal, onde foi submetido de forma sistemática a choques eléctricos para lhe matarem a mente retornada.

Por razões de trabalho viajo algumas vezes de táxi em Lisboa. Já apanhei táxis conduzidos por taxistas praticamente mudos, outros que falam em demasia, outros que relatam de forma maníaca teorias da conspiração, outros que passam o trajecto a rezar e que tentam evangelizar quem viaja com eles, outros que lêem muito, outros que não lêem nada.

Muitos que sabem tudo sobre o Benfica, alguns outros, menos, que sabem tudo sobre o Sporting, e ainda há dias um que dizia que a culpa toda disto andar a correr mal era da dark web.

Há dias, à saída de um lançamento, o taxista do táxi em que segui era para o calado até ao momento em que, na sequência de uma travagem brusca, se sobressaltou e me confessou que desde a guerra colonial, em que combateu, nunca mais conseguiu ter reacções controladas a sustos do quotidiano.

Esteve na Guiné e em Moçambique e matou muito apesar de, antes de embarcar para as colónias, sob a bênção do Cardeal Cerejeira que o ilibou da culpa, lhe ter sido dito que o que fazia era para defender a pátria e o bem nacional.

Foi capturado na Guiné, torturado, ingeriu substâncias químicas para aguentar a pressão e matar com maior ligeireza, viu e fez ainda outras coisas de que tem vergonha.

Esteve treze meses internado na ala psiquiátrica de um hospital quando regressou a Portugal, onde foi submetido de forma sistemática a choques eléctricos para lhe matarem a mente retornada e lhe voltarem a entregar uma nova sem memória. Estabilizou relativamente e tornou-se taxista.

Diz que está velho mas que não quer ficar em casa e que a mente ressuscitada desde o regresso só tem por objectivo fazer o que lhe permita perdoar-se doque fez e que os choques eléctricos n

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