Opinião

Os ecologistas e o conforto da ignorância

5 dez 2019 15:02

E havia um argumento final, mesmo da corrente humanista e do pensamento cristão: estes ecologistas preocupam-se tanto com os animaizinhos e a plantas, quando há tanta coisa a fazer para o bem estar dos seres humanos, tanta pobreza no Mundo a resolver!

A vida vai-nos ensinando alguma coisa e uma delas é que “pior que não ter razão, é ter razão antes de tempo”. E desde os anos 70 que os ecologistas vêm tendo razão antes de tempo. E as suas previsões mais negativas são as que se têm confirmado.

Muitos deles ignorados e vilipendiados, olhados de soslaio como “seres” estranhos e exóticos, eram, na realidade, uma ameaça: ao nosso conforto e comodismo, à nossa ignorância. Porque esses “defensores dos mochos e das raposas e da reciclagem e da biodiversidade” sempre nos colocaram problemas de consciência!

E havia um argumento final, mesmo da corrente humanista e do pensamento cristão: estes ecologistas preocupam-se tanto com os animaizinhos e a plantas, quando há tanta coisa a fazer para o bem estar dos seres humanos, tanta pobreza no Mundo a resolver!

Mesmo depois, quando muitos académicos integraram o grupo dos “sensíveis” à ecologia, até porque as suas investigações académicas, ou a sua sensibilidade, confirmavam as alterações climáticas em curso por efeito da acção dos Homens, mesmo esses eram, então, uma minoria, sempre implicitamente desaprovados pela maioria, porque os estudos dessas alterações não eram conclusivos e se baseavam em especulações, ainda sem solidez científica…

E a confirmarem-se alterações, impactos significativos só daqui a quinhentos, ou mil anos… e até lá, a Humanidade, na perspectiva de um progresso e desenvolvimento radiosos, encontraria seguramente soluções maravilhosas para esses problemas com os quais não nos deviamos por enquanto preocupar.

Al Gore, na “Terra à procura do equilíbrio”, explicava então, já lá vão 27 anos, parte desse desprezo da comunidade científica pelas conclusões “mais catastróficas”, pelo menos no que aos Estados Unidos dizia respeito: com centros de investigação apoiados por grandes grupos empresariais e financeiros, com os seus gigantescos lucros ancorados em actividades depradatórias e poluentes, quase que se impunha uma auto-censura dos cientistas associados para não concluirem pela evidência de alterações climáticas, receando diminuição ou corte de fundos de apoio dos quais dependiam e dependem os seus institutos.

O que todos nós menos desejamos na vida é más notícias. Por isso aderimos de imediato a quem não nos angustia com previsões alarmistas, com um futuro preocupante.

Preferimos estar do lado daquele que no remanso da sua casa ou do seu escritório aquecido, olhando para o jardim regado a horas certas, nos diz confiadamente que o mundo agora é muito melhor do que há cem anos, que a esperança média de vida é maior, que a mortalidade infantil diminui visivelmente, que a qualidade de vida é muito superior… e que as alterações climáticas sempre exisitiram ao longo dos milhões de anos da História da Terra e que não podemos dramatizar.

Por isso, não há mais tempo a perder.

Nos tempos que correm ser optimista face às questões climáticas e ambientais é pactuar com a ignorância. É quase crime.

Neste barranco em que vamos caindo, por que confiamos em quem nos garante que se trata de um suave declive?