Editorial
Um pinhal, espelho de uma Nação
Algumas zonas da mata já entraram “num ponto sem retorno”, com a acácia e o eucalipto a levarem a melhor sobre o pinheiro bravo
Partindo do princípio de que um pinheiro demora entre 25 a 30 anos a ficar apto para o fornecimento de pinho de qualidade, ou seja a atingir a idade ‘adulta’, torna-se claro que há pelo menos uma geração que já não vai ter a oportunidade de se cruzar com o futuro Pinhal de Leiria.
Há ainda uma outra geração que pode ter essa sorte, mas já numa fase onde provavelmente nem todos os sentidos, nem todas as faculdades físicas continuarão apuradas: a visão, a audição, e, em particular, os problemas de locomoção.
Em teoria, perante este cenário, só a geração que vem a seguir às duas anteriores poderia voltar a ver erguido o Pinhal de Leiria. Diferente, seguramente, mas com predominância de pinheiros adultos, independentemente de outras espécies que por ali foram sendo espalhadas, em jeito de experimentação.
Na realidade, o mais certo é que ainda não seja essa geração a usufruir em pleno da mancha florestal que foi, durante séculos, um dos principais pulmões da nossa região e um importante produtor de madeira, muito menos a poder desfrutar de um novo verdadeiro pinhal, pois como defendem esta semana investigadores e especialistas em gestão florestal, já foi desperdiçado demasiado tempo com a lentidão da máquina do Estado, a falta de investimento robusto e a crónica falta de recursos humanos.
Em 2018, um ano depois do incêndio que dizimou 86% do Pinhal de Leiria, Elizabete Marchante, bióloga e investigadora do Centro de Ecologia Funcional da Universidade de Coimbra, com trabalho na área do combate às invasoras, alertava nas páginas deste jornal para a necessidade urgente de se proceder ao controlo das acácias e do eucalipto: “Ou agimos rapidamente ou podemos chegar a uma situação sem retorno”.
Volvidos quatro anos, percebe-se que este e outros alertas semelhantes não foram tidos em consideração. Consequência: algumas zonas da mata já entraram “num ponto sem retorno”, com a acácia e o eucalipto a levarem a melhor sobre o pinheiro bravo, como relata ao JORNAL DE LEIRIA o engenheiro florestal e professor da Escola Superior Agrária de Coimbra, Joaquim Sande Silva.
Sabia-se, desde 2017, que o Pinhal de Leiria nunca mais iria ser o mesmo. O que não se esperava, sobretudo pelas inúmeras garantias e promessas, é que cinco anos depois, ainda faltasse tanto por fazer.