Sociedade
“A curto prazo, o excesso de médicos será um problema”
Rui Passadouro, recém-eleito presidente do Conselho da Sub-Região de Leiria da Ordem dos Médicos, defende que a formação do clínico “deve ir além do conhecimento médico e científico”.
Que prioridades definiu para o mandato?
As prioridades do Conselho da Sub-Região de Leiria da Ordem dos Médicos têm de reflectir as preocupações dos médicos que nos representamos e as ideias com que apresentámos ao processo eleitoral, nomeadamente a qualidade da formação, a promoção da ética profissional, a autonomia técnica e científica, entre outros. Mas é fundamental não esquecer que o objecto último do nosso trabalho são os cidadãos, doentes ou não.
Relativamente à valorização da qualidade da formação médica, o que o preocupa?
Cada um dos médicos que tem a seu cargo a formação dos jovens médicos tem o dever ético de garantir a qualidade dessa formação e de denunciar à Ordem dos Médicos (OM) os incumprimentos. O excesso de médicos em formação põe em risco a oportunidades de contacto com as doenças e as tecnologias, levando em última situação a uma degradação da qualidade dessa formação. Contudo, estaremos sempre disponíveis para ajudar os jovens médicos no sentido da valorização da qualidade técnico-científica da sua formação e da profissão.
Outra das nossas preocupações são os desafios tecnológicos que a profissão enfrenta, quer ligados directamente à actividade médica quer às tecnologias de informação. A defesa das carreiras médicas, a promoção da ética profissional, a qualidade e segurança dos cuidados também não serão esquecidos.
As presentes eleições para a OM registaram abstenção elevada. Que conclusões tira desse dado?
Apesar disso, obtivemos em número absoluto uma maior votação que nas últimas eleições e a abstenção, sendo elevada, foi ligeiramente inferior. Mas, isso faz-nos questionar a ligação dos médicos à OM. Tudo faremos para chamar os médicos à Ordem, divulgando o seu papel fundamental na regulação da actividade e na formação, promovendo encontros de carácter técnico, cultural e mesmo recreativo, porque a formação do médico deve ir além do conhecimento médico e científico.
Na região, quais os principais problemas que identifica no SNS?
Tal como acontece um pouco por todo o País, os constrangimentos no A falta de médicos nos centros de saúde foi recentemente minorada com a entrada de novos médicos de família. Num único concurso foi colocada mais de uma dezena de médicos de família.
A nível hospitalar a situação engloba um número mais complexo de variáveis. A criação do Centro Hospitalar de Leiria, com inclusão de Ourém, Pombal e Alcobaça, que considero positivo, aumentou a sua dimensão e a massa crítica, mas terá de ser acompanhada de recursos adicionais.
O subfinanciamento da saúde - 8,9% do PIB em contraste com os 9,9% de média da OCDE – é também outro dos problemas. Outro é o déficit de literacia em saúde, que tem repercussão imediata na procura inadequada dos serviços, muitas vezes em excesso, e dirigida às urgências, quando o problema poderia ser resolvido junto do médico de família.
Há falta de médicos ou estes estão mal distribuídos?
Portugal tem 4,4 médicos por mil habitantes e a média da OCDE é de apenas 3,5. Só a Grécia e Áustria têm mais médicos do que nós. No caso da Medicina Geral e Familiar, nos próximos 10 anos, irão formar-se mais de 4500, número muito acima das necessidades do País. A falta de médicos não é generalizada. Acontece em determinados locais e por deficiente distribuição.
As restrições ao pagamento de mais horas médicas, que poderão ser extraordinárias, àqueles médicos que se encontram disponíveis é mais um dos constrangimentos.
A curto prazo, o excesso de médicos será um problema não só para a qualidade da medicina, pois é manifesta a incapacidade formativa para os mais de 2000 médicos internos anuais, mas também para as outras áreas profissionais, que poderiam beneficiar dos melhores alunos do País, que artificialmente são orientados para o curso de medicina.
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