Autárquicas 2025
Debate em Porto de Mós: Trocas de galhardetes, uma falta e um minuto de silêncio recusado
Candidatos à Câmara apontaram habitação, saúde e mobilidade com as prioridades do concelho, sem esquecer o saneamento básico. Conheça as propostas apresentadas

Três quartos das cadeiras do Cine-Teatro de Porto de Mós foram ocupadas na passada sexta-feira, noite em que o JORNAL DE LEIRIA, em parceria com O Portomosense e com a Rádio Dom Fuas, promoveu um debate entre os candidatos à Câmara Municipal, iniciativa que colocou frente a frente o actual presidente, Jorge Vala (PSD), Licínio Ferraria (CH), Fernando Gomes (PS) e Marcos Ramos (IL). Das cinco forças políticas que dia 12 vão a votos, faltou a CDU, encabeçada por Telmo Cipriano, que não justificou a ausência.
Ao longo da sessão, Jorge Vala foi o candidato mais visado pelas críticas dos adversários, sobretudo por Fernando Gomes. O cabeça-de-lista do PSD, que procura a eleição para o terceiro mandato, foi tentando refutar os argumentos dos adversários políticos com os dados com que já ia munido. Tanto o representante do PS como o do Chega foram várias vezes acusados pelo social-democrata de utilizarem “falsas narrativas” e de fugirem aos seus próprios programas eleitorais.
Ao que vêm os candidatos?
Por sorteio, Jorge Vala foi o primeiro a usar da palavra e fê-lo para confirmar que o seu objectivo passa por dar continuidade ao trabalho que tem vindo a desenvolver. Para tal, diz apresentar uma lista “com um espírito renovado” mas com um núcleo duro “experiente e com provas dadas ao serviço do município”, referindo-se aos vereadores que o acompanham há dois mandatos, Eduardo Amaral, Marco Lopes e Telma Cruz.
Já Licínio Ferraria, candidato do Chega, prometeu ser a voz da mudança em Porto de Mós ao declarar a intenção de “acabar com as assimetrias democráticas no concelho”: “Há um grande contraste entre as freguesias, umas que têm tudo, outras que só são lembradas de vez em quando”, disse. Lamentando aquilo que considera ser “um défice democrático”, Ferraria aproveitou o primeiro tempo de antena para lançar um voto de protesto, sugerindo “um minuto de silêncio em nome da democracia no concelho”, pedido que foi recusado.
Começando por comungar das palavras do candidato do Chega em relação à “desigualdade de tratamento entre freguesias no concelho”, o socialista Fernando Gomes acusou Jorge Vala de estar “a falhar aos portomosenses em todos os sentidos”, alegando que o social-democrata só cumpriu “20% do programa anunciado há quatro anos”.
Marcos Ramos, que encabeça a primeira candidatura da Iniciativa Liberal à Câmara de Porto de Mós, deixou claro que o seu programa será norteado por três pilares essenciais: transparência, eficiência e proximidade. A modernização dos serviços municipais faz parte dos seus compromissos, assim como a mudança de paradigma de um município considerado “um local de passagem”, mas que no futuro “deve ser um concelho de destino”.
Reconhecimento de crise na saúde foi unânime
Embora reconheça os esforços do município com vista à resolução dos problemas que afectam os portomosenses no campo da saúde, Licínio Ferraria lamentou que iniciativas como o programa “Bata Branca ou o cartão de saúde tenham saído de alguma forma frustradas”. Em caso de eleição, quer resolver “a assimetria no funcionamento entre a USF Novos Horizontes e a USF Aire e Candeeiros” e propõe a criação de uma unidade de saúde móvel que resolva “entraves na acessibilidade a zonas mais recônditas” e a “marcação prévia de transporte para atendimento nos centros de saúde”.
Fernando Gomes partiu para o tema ao ataque, acusando o presidente da Câmara de ter atribuído este pelouro “a alguém que não percebe de saúde”. Outro dos seus alvos foi o “Plano Saúde Para Todos”, em funcionamento desde Julho de 2022 e que à data conta com 16 mil utentes. Para Fernando Gomes, “este cartão é uma afronta à dignidade” e resulta da “falta de interesse [do actual executivo] em ter médicos”. Porém, diz querer mantê-lo em funcionamento porque “não se pode chegar a um concelho com uma saúde completamente destruída e retirá-lo”.
Já Marcos Ramos aproveitou para recordar que “o problema da saúde é de âmbito nacional” e que “os municípios têm competências limitadas”, podendo actuar “sobretudo a nível logístico”. “O SNS (Serviço Nacional de Saúde) não está a funcionar porque o Partido Socialista, um dos seus fundadores, é também o seu carrasco”, atirou. Quanto à falta de clínicos, o candidato da IL pretende fazer com que o poder local seja capaz de “tornar o concelho atractivo para que as pessoas queiram viver e trabalhar”, incluindo médicos, com a redução de carga fiscal e a aposta na área da mobilidade.
Na sua intervenção, Jorge Vala falou da assinatura de “um contrato de boa fé com o Ministério da Saúde para assegurar a descentralização”, que previa obras no centro de saúde de Porto de Mós com apoio do PRR, a passagem a Modelo B da USF Aire e Candeeiros e a entrega de uma viatura “a ser usada pela Saúde Pública”, bem como a continuidade das extensões de Alqueidão da Serra e da União de Freguesias de Arrimal e Mendiga. Neste último caso, está prevista a construção de um novo edifício, “obra já aprovada pela ULS de Leiria” e a candidatura será ao Portugal 2030 será entregue em 2026, adiantou. Defendendo-se das acusações relacionadas com a criação do cartão de saúde, o candidato pelo PSD negou com veemência a possibilidade de acabar com ele.
Habitação e imigração também foram temas centrais
Foi o período dedicado à habitação que maior troca de galhardetes motivou entre PS e PSD, isto porque Jorge Vala refutou uma alegação de Fernando Gomes, que disse que Porto de Mós está a perder população, com dados estatísticos que indicam um crescimento populacional entre 2021 e 2104. Fernando Gomes contrapôs que a população pode estar a ser reposta, mas por imigrantes, versão que Jorge Vala voltou a negar: “Está a mentir. O senhor não tem noção. Temos 500 alunos a mais, dos quais 50% são portugueses. Temos mais residentes portugueses do que tínhamos em 2021. Apesar de o candidato do PS não gostar de imigrantes, nós gostamos, fazem cá muita falta”.
Que os imigrantes “fazem muita falta” diz igualmente Licínio Ferraria. Contudo, o candidato do Chega projecta que, “se a intenção do município é passar para a fasquia dos 30 mil habitantes”, a chegada de estrangeiros deve ser acautelada “com medidas de integração”.
Serenados os ânimos, voltou a falar-se de habitação, e foi aqui que Ferraria defendeu a continuidade da aposta nas Áreas de Reabilitação Urbana (ARU) com vista à criação de residências, “sobretudo em Mira de Aire”, e a aprovação de outros incentivos por parte da Câmara, entidade que diz que tem o dever de ser “uma facilitadora” e não “uma promotora imobiliária”. A fechar a sua intervenção, deixou um alerta: “Temos muitas casas em aldeias serranas para recuperar”.
Marcos Ramos é também defensor das ARU, mas avisa que estes projectos não chegam para combater a crise imobiliária. O candidato liberal pede o estabelecimento de “prazos-padrão” e de “informação clara e transparente”, defende o acompanhamento dos projectos por via digital, o alargamento do horário de atendimento do departamento de urbanismo, a criação de projectos “chave na mão” e a diminuição da taxa de derrama para empresas ligadas ao imobiliário e à construção civil.
De modo a criar mais habitação a preços acessíveis, Fernando Gomes defendeu a réplica do método utilizado nas zonas industriais, que se traduz na venda de lotes a preços mais baixos para incentivar os jovens à construção.
Voltando aos números, Jorge Vala considerou que a questão da morosidade dos serviços previamente levantada não passa de “uma narrativa”, uma vez que “o serviço está a sanear projectos em 15 dias, a arquitectura a deferi-los a 30 dias”. Ainda na habtiação, Jorge Vala avançou a intenção de fazer de uma antiga fábrica de Mira de Aire um espaço residencial com 20 novos apartamentos e associá-los a “um espaço de coworking”. Outro ponto do seu programa será a criação de mais habitações por meio de apoios estatais num terreno já reservado para o efeito.
Ligação à A1 e melhor rede de transportes
Mobilidade, obras públicas e turismo foram outros temas em denate. No plano da circulação rodoviária, pedonal e do reforço de transportes públicos, PSD, PS, CH e IL afinaram pelo mesmo diapasão ao concordarem que ainda há muito trabalho pela frente. A medida que maior atenção mereceu por parte de PSD, CH e IL foi a de uma futura ligação de Porto de Mós à A1 através de uma variante no IC9, em Santa Catarina da Serra.
Quanto à rede de transportes dentro do concelho, Marcos Ramos focou-se na apresentação de um Plano Municipal de Mobilidade Segura a ser articulado com a comunidade intermunicipal, Jorge Vala na medida já em curso de transporte flexível a pedido, na criação de um passe intermunicipal gratuito para pessoas com mais de 65 anos e nas negociações com um novo operador para se juntar à Rede Expressos na ligação entre Porto de Mós e o resto do País.
Licínio Ferraria assumiu que uma suas principais causas nesta área é a abolição de portagens na A19 e a abertura de novas variantes dentro do concelho que sirvam, sobretudo, para facilitar acessos a viaturas pesadas e a circulação entre freguesias e a sede de concelho. Por último, Fernando Gomes centrou as suas atenções na criação de uma rede de transportes camarária que funcione de hora a hora entre freguesias, uma ideia que insiste não ser “de lunático” por acreditar que “há orçamento, não tem havido é vontade”.
Ainda o saneamento
Quanto às obras públicas, reinou a troca de impressões sobre o saneamento básico. Jorge Vala afirma estar perto dos 70% de população servida e pretende nos próximos quatro anos elevar para 90% a cobertura no concelho, missão “complexa, mas não impossível”, mesmo tendo em conta “o problema de Mira de Aire, cuja resolução tem que vir da parte do Ministério do Ambiente e não da Câmara”. “É uma obra caríssima e exigente sob o ponto de vista técnico”, lamentou. Ainda assim, mostrou-se disponível para a câmara custear parte “de uma obra calculada em mais de 10 milhões de euros”.
Além de manifestar preocupações com a “falta de substituição e manutenção de condutas de água”, Licínio Ferraria voltou a denunciar “as diferenças de tratamento entre freguesias”: “Estava à espera que falasse na Mendiga e Arrimal ou Serro Ventoso, mas voltámos a falar de Cumeira, Juncal e Pedreiras. Nada contra, mas se os sete milhões de euros que transitaram de 2024 para 2025 fossem distribuídos equitativamente, se calhar até podiam ajudar”, rematou.
Outra crítica ao actual executivo partiu do Partido Socialista, com o seu candidato a acusar o PSD de apresentar o mesmo programa a nível de saneamento de há quatro anos. Reforçando a intenção de “devolver a dignidade às pessoas”, Fernando Gomes contestou as verbas utilizadas em eventos públicos e disse ter a intenção de as canalizar para esta prioridade. “Em 2025, é inadmissível que uma pessoa abra a água e não a veja correr. A vida não é uma festa”, apontou.
A Marcos Ramos também “não parece justo que em 2025 ainda se discutam problemas de saneamento básico”, cujas promessas de resolução acredita já ouvir “desde os anos 80” quer por parte dos executivos do PSD e do PS. Duvidando da possibilidade de se chegar a 100% de cobertura no concelho, o liberal defendeu a necessidade de implementar nos locais onde seja impraticável o saneamento básico fossas sépticas suportadas pelo município ou pela CIMRL.
Alavancar o turismo é uma prioridade comum
Os planos dos candidatos para o turismo marcaram a recta final do debate. Enquanto que o Chega propôs a aposta no auto-caravanismo com a criação de um parque municipalizado dotado de um posto de turismo que facilite e promova a entrada ou deslocação a outros pontos turísticos do concelho, o PS sustentou a criação de uma estrutura de apoio ao turista em Mira de Aire e um passaporte de turismo onde constem todos os pontos de interesse das dez freguesias.
A aposta no turismo de natureza é um dos maiores chavões da IL, partido que considera que Porto de Mós reúne “condições naturais de excelência” sub-aproveitadas mas que ainda podem ser potenciadas. Marcos Ramos sugere a criação de um “cluster” que atraia investimento na área e de uma marca internacional de desporto e natureza, atraindo eventos de maior envergadura mas que sejam em simultâneo promovidos em parceria com colectividades e entidades locais.
Por seu turno, o PSD quer dar continuidade à aposta no turismo de natureza procurando atrair nichos em vez de massas, por questões ambientais. A promoção desta mais-valia de um concelho que integra a maior área do Parque Natural das Serras de Aire e Candeeiros em feiras internacionais, como é o caso da FITUR (em Valadolid) e da Bolsa de Turismo de Lisboa, será também para manter.