Economia

Falta de coerência nas políticas afasta potenciais investidores

10 jun 2016 00:00

O novo presidente da Associação Portuguesa da Indústria de Plásticos fala da escassez de quadros intermédios e diz que o país “não tem um desígnio a médio e longo prazo”

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Raquel de Sousa Silva

Quais os principais desafios que se colocam hoje à indústria de plásticos, em termos ambientais e de investigação e desenvolvimento?
O plástico tem má fama ambiental. O principal desafio vai ser fazer as pessoas entenderem que, paradoxalmente, é a matéria mais ecológica que temos. Porque precisa de muito pouca energia para se transformar, contrariamente a outros produtos que supostamente são mais ecológicos, porque são biodegradáveis, como o vidro ou o papel. Sendo o plástico leve, conseguimos muito facilmente fazer outros produtos com ele. E é reciclável, pode ter variadíssimas vidas. É esta a beleza ambiental do plástico. Onde é que está a parte negativa? Não nos organizamos e disciplinamos na maneira como o arrumamos e, muitas vezes, depois de o utilizarmos não o colocamos nos circuitos de recolha que estão criados.

Falta sensibilização para que os consumidores coloquem o plástico nos locais certos para que seja recolhido e depois reciclado?
Não ponho o enfoque na sensibilização. Julgo que as pessoas sabem o que é a reciclagem, reconhecem a sua importância e querem fazê-la. Falta um passo, que tem a ver com vontade política, autarquias e alguma cultura de reciclagem que ainda não existe, para criar as condições para essa recolha selectiva. Um exemplo: em minha casa separamos os resíduos, mas temos de os levar ao ecoponto, porque o carro da câmara recolhe e coloca tudo no dito lixo normal.

A indústria tem tido dificuldade em encontrar pessoas qualificadas para acompanhar a evolução tecnológica?
Sim. A indústria sente principalmente falta de quadros qualificados na transformação das matérias plásticas, ou seja, pessoas para trabalhar nos processos tecnológicos, porque não tem havido uma adequação formativa/educativa em quantidade suficiente. Uma dificuldade neste momento é encontrar operadores com algum grau de especialização. Curiosamente, é relativamente fácil encontrar licenciados, mas não quadros intermédios

Os licenciados não querem desempenhar essas funções intermédias?
Não é que não queiram, mas o nível académico está desajustado [em alta] para aquilo que se procura num quadro intermédio. 

Como é que se resolve o problema da escassez desses quadros intermédios?
Só com formação. Uma formação orientada, feita pelos centros tecnológicos, pelos politécnicos em conjunto com as empresas. As universidades poderão igualmente vir para este campo se quiserem. 

Há pessoas dispostas a fazer essas formações intermédias, ou todas querem ser doutores e engenheiros?
Julgo que hoje as pessoas já percebem a importância de ter uma especialização, de fazer um trabalho que por vezes tem mais valor de mercado do que uma licenciatura. A dificuldade é arranjar essas forma- ções nos locais habituais, os politécnicos e universidades. Por isso, as associações e os centros tecnológicos têm um papel fundamental, porque têm de ser eles a fazer formação orientada para os seus associados. E procurar sinergias entre eles e com as empresas, que têm conhecimento que pode ser transmitido. A KLC, por exemplo, tem um programa de formação interna, dada pelos técnicos a novos colaboradores. Mas este conhecimento pode ser  posto à disposição de um grupo mais largo de empresas, assim elas se organizem.

Que desafios se colocam às empresas com o advento da indústria 4.0?
O trabalho clássico, o trabalho manual com unidades ou processos desligados, está em transformação. A percentagem dehardware vai decrescer e a percentagem de software vai aumentar, especialmente no que se refere à ligação entre processos produtivos, clientes… Vamos ter cada vez mais conhecimento que não é tangível, máquinas cada vez mais autónomas, mais controlo digital. Esta é uma transformação para a qual as empresas têm de estar muito alerta, porque vai ser exponencial.

Devemos temer um aumento do desemprego?
Não. As tecnologias existem para criar valor. Quando criam valor é para todos, empresas e sociedade. Quando uma sociedade tem mais valor disponível investe, cresce. Nunca o desenvolvimento e o progresso devem ser encarados como perigo para o emprego.

A capacidade e competência da indústria portuguesa de plásticos são hoje reconhecidas lá fora ou ser português é uma desvantagem?
Não existe nada no facto de ser português que seja negativo dentro da transformação de plásticos. Temos empresas importantes e reconhecidas a nível internacional, grande competência técnica na área dos moldes, também muito reconhecida, e os plásticos técnicos estão igualmente a começar a ser reconhecidos da mesma forma.

Das últimas eleições para os órgãos sociais da Associação Portuguesa da Indústria de Plásticos resultou uma “direcção forte com representação das várias áreas da indústria de polímeros”. Isto não acontecia antes?
O que se passou foi uma alteração estatutária importante, a mais importante desde os anos 1970. Alterou-se uma estrutura assente numa divisão geográfica – Norte, Centro e Sul – para uma divisão por fileira. Foram criadas sete áreas, cada uma com um vice-presidente. Pensamos que é muito mais apropriado e que dinamizará muito mais a associação, colocando-a mais próxima dos seus associados. 

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