Sociedade

Liguem os telemóveis que se vai aprender

3 mar 2016 00:00

O mundo está no século XXI, mas a maioria das escolas ficou no século XIX. A tendência é para alterarem esta situação começando a surgir projectos que utilizam as novas tecnologias para melhorar o sucesso escolar

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Estar em pé e desarrumar a sala de aula, arrastar cadeiras e utilizar smartphones, tabletsou computadores é admitido na Escola Básica 2,3 de Atouguia da Baleia, em Peniche, onde foi criada uma sala de aula do futuro (SAF), com o objectivo de combater o insucesso escolar dos alunos do 6.º ano.

Desde o ano lectivo de 2013/14 que nesta sala são leccionadas todas as disciplinas e, apesar deste aparente caos, proibido em muitas salas de aula, a concentração dos alunos subiu em flecha e com ela os resultados académicos.

Nesta SAF existe uma enorme mesa interactiva táctil, que pode ser usada por vários alunos ao mesmo tempo e projectada na parede com um simples arrastar de dedos. Tablets, computadores, drones, microfones, máquinas fotográficas digitais, dispositivos de resposta rápida – ActivExpression, impressora 3D, sofás, puff e mesas e cadeiras coloridas, num investimento inferior a 30 mil euros. Tudo serve para potenciar as aprendizagens. Numa era digital, a escola clássica diminuiu a resposta aos interesses e motivações dos alunos.

Os professores têm de se reinventar para tornar a escola mais motivadora. No século XXI, onde o conhecimento passou a estar à distância de um clique, as aulas onde se debita matéria começam a ser olhadas pelos estudantes como pouco atractivas. Os próprios locais de trabalho do século XXI começam a ser encarados por muitas empresas como espaços mais informais, onde há também uma preocupação com o bem-estar do colaborador e com as suas competências emocionais.

Atouguia da Baleia está já um passo à frente. Percebeu a importância das tecnologias e para dar resposta ao insucesso escolar dos alunos, sobretudo na Matemática, adaptou um projecto europeu e criou a SAF, que não é mais do que um espaço equipado tecnologicamente, onde os alunos têm liberdade para 'passear' pela sala, sem que seja sinal de indisciplina.

E o mau comportamento é algo que tende a desaparecer nestas salas, onde o uso do telemóvel começa a ser 'obrigatório'. “Tínhamos umas turmas de 6.º ano cujos resultados a matemática não eram nada animadores. Já tínhamos despejado para cima daquele ano mais recursos humanos e mais dinheiro e as coisas continuavam na mesma. Então pensámos numa coisa completamente diferente”, explica José Loios, director do Agrupamento de Escolas de Atouguia da Baleia.

A participação no Projeto EMA (Estimulo à Melhoria das Aprendizagens), da Fundação Calouste Gulbenkian, levou à criação da SAF. “Criámos uma disciplina de oferta própria que chamámos Laboratório de Matemática e Ciências, que reforçava o currículo normal, mas com uma ligação forte ao quotidiano”, adianta o professor.

Para José Loios, o papel do docente tem de ser diferente. “O professor é o coordenador do espaço das aprendizagens e continua a ter um papel muito importante na preparação e na gestão, mas não é aquele indivíduo que debita a matéria. Hoje em dia a grande diferença é esta. Os alunos têm a informação. É preciso ensiná-los a mobilizar informação, a debater, a consolidar e a estimular a criatividade.”

O papel do docente passa a ser o de orientador. “A escola tem de responder às competências do futuro e deixar de se centrar no professor, aquele que tem o conhecimento, para passar a colocar o aluno no centro, ensinando os caminhos mais correctos para chegar à informação credível e rápida”, explica José Loios.

Será que a caneta está em vias de extinção? “E se estiver?”, desafia José Loios, recordando que também se escrevia com pena e há muito que tal deixou de ser usado. Segundo o director, as SAF são “cenários de aprendizagem, sobretudo, vocacionados para uma forma de aprender relacionada com as competências do século XXI, normalmente associadas ao digital”.

O tipo de abordagens é “completamente diferente”. O próprio espaço é “preparado de maneira que as aprendizagens sejam mais significativas e para que haja uma aproximação de linguagem entre aquilo que os miúdos têm fora e dentro da escola”. O responsável constata que a escola “estava a ficar um pouco desfasada em termos de evolução”. Quando chegavam, os alunos “quase entravam no jurássico”.

A utilização das tecnologias permite ao professor saber em tempo real o que sabe o aluno, através do sistema de resposta automática, uma espécie de telemóvel, onde o alunos podem responder às questões colocadas pelo docente através de escolha múltipla, verdadeiro ou falso ou respostas abertas.

“Temos quatro salas que podem estar a funcionar em simultâneo com este sistema, que possibilita saber de imediato se os alunos aprenderam ou não o que lhes foi transmitido e ajuda a reestruturar a aula. Os próprios alunos percebem onde falharam.”

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