Sociedade
“Não se apaga fogo com fogo”
Europa em Guerra. Reportagem na mesquita de Leiria. O rapaz da Caranguejeira que se converteu ao Islão. Testemunhos de leirienses a partir de Paris. Entrevista a Bernardo Pires de Lima: “Nenhum Estado está seguro”. Escola da Gândara, exemplo de integração
"Como é que vai ser considerado mártir aquele que coloca bombas e se mata a si próprio? Está abertamente contra os ensinamentos do profeta", declara o imã Mohamad Abbas Butão, guia espiritual da comunidade muçulmana que frequenta a mesquita da Quinta do Alçada, em Leiria.
Enquanto responde à sua própria pergunta, o sorriso generoso e o comportamento amigável abraçam todas as palavras sobre os atentados de Paris. "Isto não pertence ao Islão", afirma. "Não estou a ver nenhuma parte do Islão onde eu possa enquadrar isto".
A mesquita da Quinta do Alçada é procurada por cerca de 450 muçulmanos, radicados nos concelhos de Leiria, Marinha Grande, Batalha e Ourém, entre outros. Na sua maioria vieram de Marrocos e do Uzbequistão.
Outros nasceram na Síria, Jordânia, Paquistão, Guiné-Bissau, Egipto e Moçambique. Só os homens podem participar nas cinco orações diárias e a sexta-feira é o dia de maior afluência para o culto a Alá.
A postura humilde do imã Abbas combina com o casaco de inverno que lhe cobre a túnica branca (jubbah). Diz que "todo o mundo no Islão está a repudiar" os ataques terroristas que mataram 132 pessoas na capital francesa, porque "trazer a paz através de guerras é impossível".
E cita o seu livro sagrado, o Corão: "Aquela pessoa que tira a alma de alguém, de propósito, sem nenhum motivo, é como se tivesse aniquilado todas as almas do mundo. Aquela pessoa que leva um ferro e mata a si próprio, na sua mão, estará para sempre no fogo do inferno".
O rés-do-chão que serve de templo à comunidade islâmica de Leiria não podia ser mais discreto. É um espaço comercial transformado em local de culto, com acesso pelas traseiras do prédio. Tem uma zona reservada para os rituais de purificação (ablução), que todos os fiéis devem cumprir, antes da oração, lavando mãos, boca, narinas, face, orelhas, pés e tornozelos.
Na sala principal, a que acedem descalços, o chão está coberto com tapetes. Na parede sobressai a gravura dourada que representa Meca, principal destino de peregrinação para os muçulmanos. Em qualquer dia da semana, as pessoas que ali se reúnem guardam histórias de vida muito diferentes.
Alinhados de joelhos na diagonal, de frente para Meca, convivem refugiados da Primavera Árabe, marroquinos que vieram trabalhar no comércio ambulante, em fábricas e por conta própria, imigrantes das antigas repúblicas soviéticas que ganham o salário entre a indústria e a construção civil e até um empresário da Jordânia que reside na Nazaré, casado com uma portuguesa.
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