Economia
"Nenhum pai quererá ter um filho pedreiro em vez de engenheiro"
Paulo Silva Santos, presidente da Aricop, fala dos desafios colocados ao sector da construção pela falta de profissionais, nomeadamente jovens
"Um pedreiro que seja um bom profissional aufere no presente momento um vencimento claramente recompensador, acima da média salarial do País e mesmo superior a muitos licenciados"
Há jovens de 17, 18 anos a sair da escola e a entrar no mercado de trabalho como aprendizes de pedreiro ou de carpinteiro?
Não tenho conhecimento de registos oficiais e fidedignos do assunto. Creio, no entanto, que esse fenómeno será tão menos provável quanto mais urbano for o meio onde os jovens se encontram inseridos. Haverá, contudo, que considerar questões que se justificarão por tradição familiar e de continuidade de negócios.
Por que é que não há?
Hoje, e de há muitos anos para cá, aos jovens é proporcionado um percurso de escolaridade até ao 12.º ano, que com maior ou menor dificuldade é, regra geral, concretizado. Depois, com o aparecimento dos Politécnicos deu-se a verdadeira “democratização” do acesso ao ensino superior, em grande parte motivada pela importância económica que passou a ter para os agregados familiares terem um filho a estudar “em casa”. O processo de Bolonha encurtou o tempo necessário para alcançar o tão almejado canudo (licenciatura) e aos 21 anos temos licenciados em engenharia a sair para o mundo do trabalho. Nenhum pai quererá ter um filho pedreiro em vez de engenheiro! Há uma outra questão: havia cursos técnicos de construção civil nas antigas escolas comerciais e industriais que, entre outros, formaram profissionais de excelência para o sector da construção. Esses cursos profissionais de nível intermédio acabaram. Há um conceito profundamente errado de que quem não consegue fazer mais nada vai para as obras. A actividade de pedreiro encerra tarefas que exigem conhecimentos específicos que têm de ser previamente adquiridos. Aqueles homens, alguns com pouca instrução escolar, detêm conhecimentos espantosos relativamente a conceitos tão diversificados como operações matemáticas, comportamento de materiais, conhecimento de solos ou processos gerais construtivos.
A profissão de pedreiro é mal paga? Ou ainda é, socialmente, 'menos valorizada' do que outras profissões? O que leva os jovens a 'fugir' da área?
Um pedreiro que seja um bom profissional aufere no presente momento um vencimento claramente recompensador, acima da média salarial do País e mesmo superior a muitos licenciados. Naturalmente que a valorização social é diferente. No entanto, ela só por si não paga contas. A dignidade está em primeira linha nas próprias pessoas, nos seus actos e acções, nas suas atitudes e comportamento. Depois, não há desempenhos que não sejam dignos, honrados ou socialmente relevantes. Temos de pensar que formamos todos uma grande cadeia e os desempenhos de cada um têm de ser entendidos complementarmente. Todos somos precisos e isoladamente não atingimos coisa alguma como sociedade. Eu não sei operar uma apendicite, mas o médico não sabe construir uma casa. Nessa linha, é a própria sociedade que tem um grande percurso para fazer! Há ainda outra questão de fundo, que é a exigência física que a profissão tem. Aqui as coisas não se resolvem num quarto fechado, a “passar o dedo” pelos ecrãs. A economia 4.0 anda um bocado mais
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