Sociedade
Os cogumelos são todos comestíveis. Alguns é que só se comem uma vez
Micologia | Assim que chegam as chuvas frias de Outono, as matas são percorridas por gourmets, em busca de cogumelos. É uma actividade que requer conhecimento e cuidados
Começamos com dois avisos. Em primeiro lugar, embora, neste artigo, falemos da colheita de cogumelos selvagens, não a aconselhamos, a não ser que se tenha um bom conhecimento do assunto.
Em segundo, também não recomendamos mezinhas, como derramar azeite, colocar alho em cima dos fungos ou cozê-los com o dito alho, entre outras soluções caseiras, para identificar os que são comestíveis e os venenosos. Até, porque, como se diz, por piada, nos fóruns sobre o assunto: “comestíveis são todos. Alguns é que só se comem uma vez”.
Samuel da Costa é um apreciador de cogumelos, em especial daqueles que surgem nos bosques autóctones do planalto de Santo António, no Parque Natural das Serras de Aire e Candeeiros.
Diz ser ali que aparecem alguns dos mais deliciosos, mas alerta para a existência de muitos que são mortais para o ser humano e ainda “outros que fazem rir quem os come”.
“Dizem que quem colhe cogumelos são apenas os velhos e os aventureiros. Aprendi com muitos guias, algumas saídas de campo e amigos que são micólogos [especialistas em fungos)”, explica, ressalvando que, de qualquer forma, só devemos consumir cogumelos quando temos “110% de certeza” de que não são de uma espécie tóxica.
“Mesmo assim, deveremos começar com pequenas quantidades, pois mesmo tendo ‘110% de certeza’, os cogumelos podem causar reacções alérgicas graves”, resume.
Míscaros e tortulhos
O alerta para a necessidade de identificar com o máximo de certeza as espécies e, ainda assim, duvidar, tem um fundamento prático, alicerçado até em eventos recentes do mundo micológico.
Durante décadas, para Maria do Rosário e para o marido, Pedro Santos, a chegada das chuvas e do sol de Outono era sinónimo para tardes de domingo a passear pela Mata de Leiria, explorando montes de caruma, para apanhar os cogumelos amarelinhos que se aninhavam debaixo da manta morta.
“Desde pequena que sempre gostei de míscaros. Eram os únicos comestíveis que sabia identificar. O meu marido conhece mais e prefere os tortulhos, que têm um chapéu branco e aparecem em montes de estrume curtido nos campos. Mas são muito parecidos com outros que são venenosos e por isso prefiro ignorá-los”, conta a septuagenária.
Pedro, também na casa dos 70 anos, endireita-se na cadeira e diz com olhos a brilhar que os tortulhos (Macrolepiota procera) “são bons grelhados e regados com azeite, sal e um pouco de alho”.
O problema é que, apesar de os míscaros (Tricholoma equestre ou Tricholoma flavovirens), com a sua textura a lembrar a carne, por cá, até serem um prato tradicional, quando juntos a arroz ou em açorda, em Espanha e França, foram adicionados à lista de espécies perigosas para consumo humano.
A questão parece, contudo, estar associada a casos de consumo exagerado sistemático, pelo que o melhor mesmo será não abusar e não encher o prato. “De qualquer modo, já não há pinhais para os procurar”, lamenta Pedro Santos, com um encolher de ombros.
Recordando que, dantes, havia menos cuidado e muitos casos de famílias inteiras que morriam envenenadas, porque no meio de uma mão-cheia de cogumelos, "lá vinha um venenoso, semelhante aos comestíveis". “Agora, ouve-se falar menos disso”, reconhece.
Zito Camacho é um amante do mar e dos seus frutos, mas quando o oceano está pouco amistoso, vai à “caça” de frutos da terra, neste caso, de boletos, cantareis, míscaros e pés de galo.
Foi com um amigo uma vez e tomou-lhe o gosto.
“Conheço bem só meia-dúzia de espécies. A região também não oferece muitas mais”, admite. É nos pinhais e nas matas autóctones que se encontram. Os eucaliptais, pela ausência de verdadeira manta morta e a toxicidade do óleo que cai das copas, dificultam a fixação de cogumelos.
“Vou quando o tempo ajuda. Tem de haver chuva, sol e frio. Por exemplo, sem frio e sol, não se encontram boletos.”
Estes, na fotografia abaixo, são os seus favoritos. São dos mais difíceis de encontrar e só aparecem em matas autóctones de carvalho, azinheira, carrasco, sobreiro e algum pinheiro.
“É muito saboroso. Tem um gosto de avelã e madeira. Aliás o cheiro é a terra e a pinho”, descreve. O problema do bolet
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