Sociedade

Sérgio Lorga: “As pessoas da região de Leiria são muito focadas em atingir objectivos”

15 jun 2017 00:00

Especialista em benchmarking, que na terça-feira estará no ISLALeiria para uma conferência, aponta a capacidade competitiva e de “renovação” económica como duas das características distintivas da região.

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Maria Anabela Silva

Durante recente fórum da CIMRL (Comunidade Intermunicipal da Região de Leiria) afirmou que, se mandasse neste País, havia duas revoluções pelas quais iria pugnar: a cultural e a desportiva. Porquê?
Porque têm a ver com a formação base das pessoas, com a capacidade de serem mais livres e mais fortes e de aprenderem os valores do trabalho e da superação. Do ponto de vista da cultura, é o espírito que se abre, os horizontes que se alargam, o saber que a diversidade é um valor essencial da vida. Do ponto de vista desportivo, é a capacidade de perceber que muitas coisas se fazem com o espírito de conquista. O desporto, mesmo numa perspectiva amadora, tem o lado da superação e da socialização, o saber perder, o ganhar e o fair play, valores essenciais para que as pessoas sejam equilibradas e felizes.

A região está a saber aproveitar a dinâmica cultural de Leiria?
Essa dinâmica não aparece por acaso, mas pelo trabalho de muitas pessoas da região na música, no teatro, na dança ou nas artes plásticas. Vem do mérito das 'SAMPs', dos 'Orfeões e das filarmónicas. Do ponto de vista de aproveitamento da região é essencial que haja capacidade de cruzar cultura com as actividades turísticas. A cultura é um bom ponto para afirmar a região. Se houver estratégia, será mais fácil aproveitar esta dinâmica. A criação de incubadoras criativas nos vários concelhos pode ajudar a estruturar uma rede cultural para a região e para que esta vinque no seu plano estratégico a importância que a cultura tem na diferenciação deste território.

Falou de identidade e de diversidade, mas há ainda a tendência de os municípios, quando pensam na valorização do território, replicarem fórmulas de outros territórios.
Quando se têm marcas de carácter muito acentuadas - e a região de Leiria tem algumas -, é sempre mais fácil afirmarmos um posicionamento. Leiria tem a sorte de ser um distrito industrial, com uma enorme identidade. O complexo dos moldes e a tradição dos vidros na Marinha Grande e dos plásticos em Leiria, da metalomecânica e do sector agro-alimentar permitem à região ter uma vocação industrial clara, que deve ser renovada, como está a acontecer. Os empresários da região têm feito um grande trabalho na renovação dos factores competitivos. Em resultado disso, temos empresas e uma economia muito internacionalizada.

Mas essa dinâmica não é homogénea em toda a região.
Não é nem tem de ser. Um território afirma-se também pela complementaridade. Já se percebeu que o modelo de ter parques empresariais em todos os município ou infra-estruturas culturais iguais em todos os concelhos não é o mais correcto.

Como se pode incentivar o modelo, em que uns abdicam em favor de outros pelo bem comum?
Há formas de promover essa cooperação. Dou o exemplo de uma das áreas em que trabalho, a gestão em rede de parques empresariais. Na Alemanha há municípios que combinam entre si fazer um parque e investem em conjunto, escolhendo a melhor localização em termos de acessos, infra-estruturas (electricidade, água, gás), impacto ambiental e proximidade aos consumidores. Olham para a região de uma forma integrada. O parque até pode ficar longe das localizações habituais, desde que seja economicamente atractivo. Depois, repartem os ganhos. A cooperação implica a partilha de objectivos e de ganhos para todos.

Por que é que ainda é difícil implementar esse pensamento em Portugal?
Esses pensamentos são graduais. Quando se percebe que o custo do investimento tem de ser minimizado, pago e rentabilizado, é mais fácil olhar para o lado racional. Fazer um parque empresarial numa zona mais afastada tem custos de terreno mais baixos. Se lhes oferecermos um conjunto de infra-estruturas e capacidade de gestão, as empresas percebem que minimizando o investimento têm serviços de qualidade e que o valor imobiliário mais baixo do projecto compensa o investimento. Nos sítios onde isto funciona, estas questões foram organizadas por motivos de racionalidade económica e não de amizade.

Tem feito trabalho de benchmarking em várias cidades. Colocando esse olhar sobre região de Leiria, que pilares estratégicos podiam emergir neste território?
Os pilares que foram trabalhados no fórum da CIMRL são importantes para qualquer região: cultura, educação, turismo, saúde e sector empresarial. Este é o pano de fundo. A evolução é feita em função de objectivos de longo prazo. Se queremos ter a cultura como pólo dinamizador, então, devemos traçar objectivos para este sector. Se ambicionamos ter uma saúde e uma educação melhores para os cidadãos da região, temos de ter objectivos para isso. Todas estas áreas requerem visão, conhecimento e capacidade de trabalho. Devem ser criadas unidades de missão, com especialistas em cada área, dando- lhes objectivos e meios para os alcançar e exigindo-lhes a apresentação periódica de resultados.

Quando participa em conferências costuma sustentar as suas intervenções com casos concretos. O que vê na região que pode servir de exemplo?
A rivalidade saudável entre as dinâmicas industriais da Marinha Grande e de Leiria e Pombal. A forma como esta rivalidade funciona a favor do desenvolvimento e como tem puxado pela dinâmica económica da região é um exemplo fantástico. Há também a capacidade competitiva, uma das marcas distintivas desta região, das poucas do País com uma cultura de indústria claramente vincada. A capacidade de renovação económica também difencia esta região.

Que outras características diferenciam esta região?
As pessoas da região de Leiria são muito pragmáticas e muito focadas na concretização de objectivos. Encontro muito esta característica em empresários, que, no geral, têm um lado muito perspicaz e focado para fazer as coisas acontecer. Às vezes, falta- nos um pouco de consistência e de visão estratégica. O lado prático é extremamente importante, mas o lado do conhecimento dá capacidade de acção. Esse trabalho que tem vindo a ser feito deve ser permanentemente renovado e estimulado. Destaco ainda a ligação entre o Instituto Politécnico e as empresas e o papel que a Nerlei joga neste território. Esta integração de objectivos dará óptimos frutos no futuro. Já está a dar.

Desse ponto de vista, a passagem do IP Leiria a universidade não fará falta?
A região deve orgulhar-se de ter empresários de braços abertos ao IP Leiria e de ter um politécnico preocupado em responder aos desafios das empresas. Isso é o mais importante. Não sou a pessoa mais indicada para entrar na discussão politécnico ou universidade, mas há grandes universidades no mundo que são politécnicas e não querem ser outra coisa.

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