Opinião

A dessnobizadora

14 nov 2025 11:21

A condescendência das elites em relação a forasteiros criadores de suínos não é uma praga exclusiva de escritores alfacinhas

Há algumas semanas deu brado um artigo de opinião de uma escritora que não gosta do programa Preço Certo. Isabela Figueiredo escreveu no Expresso sobre a fraca qualidade da televisão em Portugal e na Europa, apontando particularmente ao Preço Certo e sugerindo que se substitua por um programa de música e teatro, ou documentários de carácter construtivo.

Ora, sendo uma coluna de opinião sobre os gostos televisivos de uma pessoa, porque deu tanto brado? Bom, na verdade porque Isabela Figueiredo usou um tom condescendente e elitista. Escreveu: “Suporto o Preço Certo há mais de 20 anos. Sempre foi mau.”, exprimindo a sua aceitável opinião.

E acrescentou: “Salva-se a autenticidade do público. Portugueses reais. Parecem os familiares da terrinha, que visitamos no Natal. Gente boa que mata o seu porco quando chega a altura correta do ano”, mostrando que os rústicos que frequentam o programa – e suponho todos aqueles que o tornam líder de audiências há décadas, para desespero dos canais privados – são diferentes de si, habitantes numa terrinha longínqua que merece uma fugaz visita anual.

A condescendência das elites em relação a forasteiros criadores de suínos não é uma praga exclusiva de escritores alfacinhas, ou de intelectuais que leem Kierkegaard na versão original. Em diferentes urbes encontramos uma clique que se arvora a elite da cidade. Que frequenta determinados espaços restritos, faz atividades exclusivas, e ergue muros à pertença de “gente autêntica” na sua bolha.

Leiria, por seu lado, é o absoluto oposto. As atividades disponíveis na cidade são amplamente participadas. De tal modo que, chegado o Outono instala-se no eixo Fonte Luminosa – Parque Camões – Largo do Papa um autêntico parque de campismo, composto por tendas, roulottes e bungalows para dar apoio aos eventos que se sucedem em catadupa. Estamos já ansiosos pela chegada do Pai Natal que irá depositar as suas oferendas numa gigantesca árvore, dimensão ajustada à participação popular no evento.

Leiria é uma cidade verdadeiramente dessnobizadora (ou seja, que combate os snobs e o snobismo em geral). Graças às suas atividades unicamente dirigidas às massas, é absolutamente impossível o snobismo prosperar na nossa cidade. E devido a esta maravilhosa condição, vamos ser um povo unido, solidário, e coeso! Sem diferenças, sem hierarquias, rumo a um destino utópico. E com isso, vamos inspirar o Mundo e todos irão aprender connosco como é viver sem snobismo! Leiria dessnobizadora como farol do mundo civilizado!

Texto escrito segundo as regras do Novo Acordo Ortográfico de 1990