Opinião

A “Economia do Ano”

20 dez 2025 10:35

As perspetivas para 2026 têm menos a ver com taxas e mais com tectónica

O ano de 2025 acaba com um elogio que sabe a ironia: o The Economist colocou Portugal no topo do seu ranking, chamando-nos “economia do ano”. A justificação foi algo rara – crescimento sólido, inflação contida, emprego a aguentar-se e mercados em alta - com a bolsa a subir mais de 20%. Num país habituado a pedir licença para existir, isto soa a capa.  

Mas 2025 foi, acima de tudo, um ano de laboratório. Com o BCE a descer a taxa de depósito para 2,00% (11 de junho), o dinheiro deixou de ser um castigo e voltou a ser uma ferramenta. O Banco de Portugal aponta 1,9% de crescimento em 2025 e 2,2% em 2026, com a inflação a cair para 2,2% e 1,9%.

Até aqui, parece um “final feliz” – mas nada disto tem em conta o aumento do custo de vida, sobretudo da habitação e o problema do crescimento salarial e da produtividade (continuamos com uma especialização produtiva pouco focada em alto valor, pequenas empresas, salários baixos, pouca exportação de tecnologia e onde muitos lutam para sobreviver).

As perspetivas para 2026 têm menos a ver com taxas e mais com tectónica. A guerra continua a redesenhar mapas e cadeias logísticas e, mesmo quando surgem sinais de negociação, como a disponibilidade de Kyiv para abandonar a ambição de NATO em troca de garantias de segurança, a paz (se vier) chegará com cláusulas, não com abraços.

Do outro lado do Atlântico, o problema chama-se previsibilidade. A Scope descreve uma política comercial americana volátil e presa a batalhas legais, com o Supremo Tribunal a poder mexer (já entre o fim de 2025 e janeiro de 2026) no enquadramento de grande parte das tarifas de 2025.

Depois há a crise automóvel europeia, que já debatemos nestas páginas. O setor foi apanhado na curva apertada da transição elétrica, registando uma travagem da procura e a concorrência chinesa (tantos executivos com MBAs de milhares de euros não quiseram ver que estávamos na armadilha do Dilema do Inovador).

Na China, as vendas de carros de luxo estrangeiros estão a cair, pressionando marcas europeias. Na Europa, discute-se aliviar metas e o setor do elétrico avisa que qualquer recuo só amplia a distância para a China (combater inovação com ainda mais lentidão não vai resolver, só vai cavar ainda mais o fosso de competitividade). A Volkswagen é o símbolo perfeito desta crise, preparando o fecho da unidade de Dresden e um plano que inclui 35 mil cortes.

A inovação não pode ser um “departamento”, tem de passar a ser defesa (no duplo sentido, porque a “Defesa” é a palavra do ano para 2026). O próximo ano vai premiar quem tratar dados, energia, software, inovação, como parte do produto - e não como burocracia. O elogio do Economist é bom, mas não segura nada.

O País tem de seguir um caminho de reformas reais (que cortem a burocracia, melhorem eficiência) e não de pseudo mudanças (como as laborais que poucos pediam). Esperemos que 2026 seja o ano da economia (para além da “economia do ano”).
 
Texto escrito segundo as regras do Novo Acordo Ortográfico de 1990