Opinião

A paranóia duma paranóica que tem a mania da paranóia

22 set 2016 00:00

O mundo está todo experimentado e em auto repeat porque a vida é daninha e injustificada, um projecto esquecido, clonado sem querer.

Permanentemente fora dela, do outro lado da distracção, a ver-se a ser. Mas também, e sempre alerta, o de dentro dela não descansa, quando compra batatas e quando fala com pessoas que não conhece ou conhece mal.

A ansiedade está antes da interacção já prevista (como estando em fila) e logo a seguir à interacção, por ser impossível evitar sobreanalisar o sucedido e por, como se calcula, prever uma eventual continuidade interaccional. Tudo isto consciente, tudo isto oco, tudo isto teatro entre a necessidade e a mania de evidenciar o outro, quase fingimento mas que não chega a ser.

Existir a estudar a existência sem saber se isto sequer o é. Sempre a ver se há férias ou acidentes ou incidentes, não interessa, desde que sejam de natureza reflexiva no sentido de reagir a. Mas são muito poucas as surpresas, de maneiras que a espiral adensa-se e faz-se mais ruidosa com o passar dos dias, de forma tão bruta que quase não ouve a verdade quando ela aparece, leva tudo a eito quando devia levar quase tudo a peito.

O mundo está todo experimentado e em auto repeat porque a vida é daninha e injustificada, um projecto esquecido, clonado sem querer. Tem a tendência para viver ofuscada entre a genuinidade e o plástico da vida, que acaba por aceitar com pouca resistência mas não é capaz de evitar a respiração ofegante em quase todos os momentos que está acordada, o que acaba por ser uma representação do tamanho da sua dissonância existencial.

*Músico

Leia mais na edição impressa ou torne-se assinante para aceder à versão digital integral deste artigo.