Opinião

A regra da excepção

15 abr 2022 15:45

Contra a varíola, um vírus muito estável, demorámos cerca de dois séculos a conseguir erradicá-lo

Foi a 14 de abril de 1796 que Edward Jenner fez o primeiro ensaio de vacinação contra a varíola, a única doença infeciosa que, até à data, foi completamente erradicada do mundo.

Ao longo da história a varíola foi responsável por várias epidemias letais, a primeira descrita em 430 a.C., em Atenas, dizimando um terço da sua população.

Relatos dos séculos II e III descrevem nova epidemia que dizimou grande parte da população do Império Romano, e que, juntamente com o sarampo e varicela, terá bastante contribuído para o seu declínio.

A China foi igualmente afetada por esta epidemia, oriunda da Índia, motivando a alteração das suas rotas comerciais. Colombo terá levado consigo este vírus para a América Central e também nós para o Brasil.

Na Inglaterra do século XVIII, 10% das mortes (mais de um terço crianças) eram causadas por varíola.

Jenner reparou que um subgrupo da população inglesa nunca contraía a doença: as mulheres ordenhadeiras de leite de vaca.

Percebeu ainda que as vacas tinham uma doença semelhante à nossa varíola, mas que esta não se propagava para nós.

Postulou então que estas mulheres, ao manipularem as vacas infetadas e o seu leite, ficariam também elas infetadas com esta outra doença, inócua para a sua saúde mas que as protegia da varíola humana.

Acreditando nesse conceito, Jenner inocula uma criança de 8 anos, com pus recolhido de pústulas destas mulheres, e a criança não desenvolveu varíola ao ser depois inoculada com pus de doentes ativos.

Este resultado permitiu posteriormente replicar a técnica por toda a população, incluindo o seu filho Robert, de 11 meses.

A esta técnica de imunização, Jenner chamou vacina, por derivação do latim da palavra vacca, atendendo à sua origem.

E por isso hoje, ao dizermos que nos vacinamos, estamos a reconhecer, ainda, o mérito de Edward Jenner no trabalho que desenvolveu contra a varíola, inoculando soro contendo um vírus semelhante ao vírus humano e com isso nos permitia adquirir imunidade total contra este.

Bom seria que contra este novo vírus corona a mesma abordagem e eficácia se alcançasse rapidamente.

Contra a varíola, um vírus muito estável, demorámos cerca de dois séculos a conseguir erradicá-lo.

Contra este, e tantos outros, bastante mais instáveis e mutáveis, como já percebemos, poderemos demorar tanto ou mais tempo, não sabemos.

Sabemos sim que há esperança de, um dia, podermos juntar à varíola outras doenças infeciosas.

No momento, estamos quase, quase a conseguir juntar a poliomielite a este grupo ainda uno.

Atualmente são poucos os casos de poliomielite no mundo, contida apenas no Afeganistão e Paquistão.

A Organização Mundial de Saúde está a envidar esforços para imunizar em massa essas crianças para que então se consiga declarar também esta doença completamente erradicada do mundo.

Mantenhamos essa ideia para as demais imunizações a que felizmente temos tão fácil acesso para, em conjunto, conseguirmos erradicar outras mais doenças do nosso mundo, mesmo que séculos sejam precisos para tal.

 

Texto escrito segundo as regras do Acordo Ortográfico de 1990