Editorial
Apontar o dedo é fácil, mas nada resolve
Apesar das explicações do ICNF, a olho nu, percebe-se que há, nas matas nacionais, espécies exóticas invasoras, como as acácias, as ervas dos pampas e o omnipresente e pirófito eucalipto
O JORNAL DE LEIRIA dá conta esta semana de uma análise ao estado actual do Pinhal de Leiria, constante de um documento com textos e imagens enviado em Março ao presidente do ICNF – Instituto da Conservação da Natureza e das Florestas, onde são relatados o “falhanço nas plantações”, o “desperdício dos dinheiros públicos”, a “situação verdadeiramente absurda e muito prejudicial” em vários talhões com regeneração natural, o “problema grave de invasoras”, “erros técnicos”, “desleixo”, “falta de conhecimento” e “abandono”.
A poucos dias de se completarem sete anos sobre o incêndio que destruiu 86% daquela mata, o autor do relatório, Octávio Ferreira, engenheiro silvicultor aposentado com 40 anos de experiência a trabalhar em florestas do Estado, incluindo o Pinhal de Leiria é acutilante nas expressões utilizadas.
Dá vários exemplos de más práticas e abandono e exemplifica, na Mata Nacional de Leiria, com o relato de talhões plantados no Inverno de 2017/2018, onde todos os pinheiros morreram ou estão sufocados pelo matagal.
O ICNF refuta as críticas com números actualizados e diz que “a taxa de mortalidade está dentro dos valores expectáveis” e que a taxa de sobrevivência ronda os 75%.
Apesar das explicações, a olho nu, percebe-se que há espécies exóticas invasoras, como as acácias, as ervas dos pampas e até o omnipresente e pirófito eucalipto que ganham cada vez mais espaço onde deveriam ser completamente erradicadas.
Apesar das garantias do ICNF, o que se passa nas matas atlânticas que se estendem do norte do concelho de Alcobaça, até ao sul do concelho da Figueira da Foz tem de ser acautelado, porque não tem sido apenas a voz de Octávio Ferreira a alertar para o que se passa.
A própria Câmara da Marinha Grande insiste que a reflorestação “conste da agenda de prioridades do Governo.”
Por tudo isto, neste momento, mais do que tentar encontrar responsáveis, são necessárias soluções que não se esgotem na ânsia justiceira de identificar bodes expiatórios, pois apontar o dedo é fácil, mas nada resolve.
É preciso coragem para fugir da mediocridade e tomar verdadeiramente decisões.
“Suspendam-se por um ou dois anos as novas plantações, dê-se no imediato prioridade ao tratamento das plantações já realizadas, limpem-se os matos, façam-se retanchas e adubações”, diz Octávio Ferreira.
Mas haverá coragem e bom-senso para tal?
Haverá coragem para voltar a colocar no terreno equipas que façam a gestão de uma das mais emblemáticas matas do Estado?
Ser não o fizer, a tutela não poderá dar exemplos a ninguém e muito menos obrigar os privados a gastar milhares de eurosanualmente, quando ela própria falha.