Opinião
Bom senso e civilidade
A baixa de Leiria, como se não bastasse a “eventite”, está agora ameaçada com um novo regulamento para a construção no Centro Histórico
Leiria foi acometida nos últimos anos de “eventite”, um surto insidioso que olha para uma cidade como um grande palco de eventos. O fenómeno, vulgarmente conhecido por “festas e festinhas”, não seria dramático se ocorresse com conta peso e medida, promovesse a economia local, o desenvolvimento da cidade e não tornasse a vida de quem mora no coração da cidade um verdadeiro inferno.
Ao fim de anos e anos disto, subitamente, a cidade acordou para o exagero que são demasiados eventos, demasiado ruído, demasiadas limitações para quem quer circular na cidade, a pé, de carro, ou simplesmente ir buscar os filhos à piscina e não consegue porque os eventos atam em nós cegos o trânsito, atropelam relvados e compactam os solos do Jardim das Almuinhas, arrancam lombas e desesperam leirienses com um nível de ruído intolerável. Eventos pagos com os nossos impostos…
O nível de queixas foi desta vez tão significativo, que justificou no dia seguinte o anúncio de medidas, por parte da autarquia, para mitigar os excessos dos eventos.
Eventos esses promovidos pela própria autarquia, como se os eventos que são planeados, financiados e executados pela câmara, de repente ganhassem vida própria e decidissem por sua vontade repetir-se em vários fins de semana seguidos, com música de gosto duvidoso a berrar em sistemas de som que atiram para dentro das casas música pimba às sete e meia da manhã de um domingo, depois da meia-noite de um sábado ou espalham tintas e espuma pela cidade – num manifesto de sustentabilidade ambiental sui generis…
Vem depois a polémica: “Ah os críticos dos eventos em Leiria o que desejam é o deserto que a cidade era antigamente, onde aos fins de semana até um café aberto na Praça Rodrigues Lobo era impossível de encontrar…”
Não.
Os críticos dos eventos em Leiria o que criticam são os excessos. Tornar o debate num tudo ou nada, é infantil, desonesto intelectualmente e pobre enquanto debate. Entre o zero e o cem, há uma infinidade de calibrações, que o bom senso deveria regular, a auscultação às populações deveria moderar e experimentar viver no coração da cidade durante os eventos, clarificar.
Muito não é bom. Nada não é bom.
Alguns eventos, para públicos diversos, espaçados no tempo, sem transtornos significativos no quotidiano das populações, que desenvolvam públicos, que respeitem as grandes preocupações do nosso tempo – com a questão da sustentabilidade ambiental à cabeça – e que ocorram em espaços diversificados, para não transtornar sempre a vida dos mesmos, os que habitam ou circulam no coração da cidade -serão sempre bem-vindos.
Acresce a isto que a baixa de Leiria, como se não bastasse a “eventite”, está agora ameaçada com um novo regulamento para a construção no Centro Histórico, que a autarquia quer fazer aprovar.
A Adlei – em boa hora - promoveu um debate sobre o tema. Eu, que saí de casa numa sexta à noite para ouvir o debate, fiquei preocupada com o que ouvi dos oradores e mais ainda com o que ouvi do público presente.
Mas isso, não cabe aqui agora.