Opinião
Burro
Nunca falhei as votações mas, cada vez com mais frequência, deixei de riscar cruzes nos quadradinhos e fui deixando o espaço em branco.
Caros senhores: cansei-me. Desde os dezoito anos que não falho uma única votação, lembro que na primeira vez até me comovi quando estendi o cartão de eleitor à senhora que riscava os nomes.
A comoção perdeu-se ao longo do tempo mas continuei a fazer cruzes nos quadradinhos, assinalando as pessoas e as ideias com que mais me identificava. E lá fui acumulando decepções e descrenças, lá fui disfarçando desânimos.
Nunca falhei as votações mas, cada vez com mais frequência, deixei de riscar cruzes nos quadradinhos e fui deixando o espaço em branco. Nunca aconteceu ter votado em alguém que tenha ganho (excepto no referendo do aborto) mas ninguém tem culpa por as minhas ideias não coincidirem com as da maioria.
A diferença é que, agora, já não encontro grande eco dessas minhas ideias em nenhum dos caros senhores. Zero identificação, zero cruzinhas. Ainda assim, há que ser optimista, há que acreditar. Pensava eu. Mas já não penso. Cansei.
Estamos no início de Março de 2017 e daqui uns tempos ninguém vai lembrar o que domina notícias e comentários por estes dias: a idiotice à volta da CGD. E foi esta idiotice que me fez cansar de vez, apesar de não ser muito diferente de tantas idiotices que ficaram para trás.
Caros senhores: julgam que ninguém percebe que se entretêm em joguinhos a ver quem quilha (queria usar outra palavra) mais os outros? Julgam que ninguém percebe como aquilo que vos move é o vosso interesse e ego? Julgam que as pessoas são burras? Pois se julgam isso, julgam bem. As pessoas devem ser burras, porque apenas assim se entende que continuem a dar confiança (a dar cruzinhas) aos caros senhores.
*Escritor
Leia mais na edição impressa ou torne-se assinante para aceder à versão digital integral deste artigo.