Opinião

Casamentos, ou a omissão incauta dos riscos da autotestagem

17 set 2021 15:45

A ânsia de voltar à normalidade está a trazer outros riscos que importam acautelar

Prometi a mim mesma não voltar a este tópico, mas não consigo evitar.

Fui a um casamento este fim-de-semana. Um dia antes do fim das máscaras. Um ano e meio depois das restrições.

Voltaram as festas em grande escala. Mas antes da festa (só antes da festa, não antes da cerimónia ou de todos os beijos e abraços que vi serem trocados à chegada) todos os convidados tiveram que mostrar ou que estavam vacinados ou que tinham feito um teste, sem indicação de quando nem como, ou na falta de uma destas evidências, fazer um autoteste rápido à presença de SARS-CoV-2.

Mas só quem tivesse mais de 12 anos. Abaixo disso, nada era preciso atestar ou testar. “Para que todos usufruam da festa em tranquilidade”.

Como assim? Os vacinados e os menores de 12 anos não podem ser portadores do vírus?

E os portadores não podem fazer um teste que tenha um falso resultado negativo?

Para que servem então estes testes rápidos à porta da festa se acoplados a exceções? Terão verdadeira efetividade como preventores de infeção?

Enquanto esperava para mostrar o meu certificado, não de vacinação porque não passaram ainda 14 dias desde a segunda dose, mas de testagem (que não fiz no local, e por isso, ainda que com um resultado negativo, já poderia ter sido infetada depois de feito o teste), dei por mim a colocar uma série de outras questões.

E se o resultado de algum daqueles testes rápidos, que vi serem ali feitos, em cima de uma qualquer mesa de jardim, sem qualquer rigor técnico (o tempo indicado nas instruções foi cumprido? a zaragatoa bem introduzida no nariz? bem processada?) desse positivo? 

O que é que se fazia? Íamos todos para confinamento? Ou só a pessoa que fez o teste? E quem tomava essa decisão? Quando? Como? E a festa? Acontecia?

Os noivos? Iam de lua-de-mel? Estariam eles, e os demais, conscientes destes riscos paralelos?

Fazer um teste auxiliar de diagnóstico é um ato de enorme responsabilidade. Não pode ser um ato leviano e descuidado como o que vi acontecer no sábado.

É preocupante o risco destes autotestes. Não são feitos para responsavelmente avaliar nada.

Têm como propósito único o acesso imediato de alguém a um espaço. Atitude extremamente arriscada.

A manipulação de resultados é muito fácil e a leviandade com que são feitos isso aponta. Estão portanto, longe de promoverem a saúde pública.

Entendo, e concordo, que é preciso encontrar formas de incentivar a adesão à vacina. Mas fazê-lo em formatos que promovem a crítica descredibiliza ainda mais essa intenção.

Se é para testar, é para testar todos. As exceções descredibilizam. Como descredibiliza o facto de só se pedirem testes ao fim-de-semana para acesso aos restaurantes.

Testar sempre, não só seria mais coerente, como incentivaria ainda mais a vacinação. O contrário é contraproducente.

Reforça a opinião de quem critica. Foi o que ouvi enquanto esperava para mostrar um certificado que talvez pouco ou nenhum valor teria.

A ânsia de voltar à normalidade está a trazer outros riscos que importam acautelar.

 

Texto escrito segundo as regras do Acordo Ortográfico de 1990