Opinião
Está aí alguém?
Não sinto pulso desse lado. Faz sentido continuar aqui? Estas palavras servem para alguma coisa?
Havia um hábito de trocar mensagens entre leitores e cronistas. Umas vezes para dizer bem, outras para dizer mal, mas quase sempre com o intuito de trocar ideias, de debater. Os comentários que de vez em quando surgem nas redes não entram nesse campeonato e, tirando esses, nunca recebi uma comunicação deste jornal a dizer que algum leitor havia enviado uma mensagem para mim.
O número de pessoas que lê jornais tem descido, é certo, mas nem uma pessoa tem uma crítica, um elogio, uma ideia para trocar? Sinto-me sozinha nesta coluna! É esta ausência de contacto apenas mais um sintoma de uma sociedade que sabemos cada vez mais atomizada? Poderia eu entregar as minhas crónicas ao Chat GPT, em vez de acordar às 6 da manhã stressada porque estou mais uma vez atrasada para entregar o texto para a edição?
Alguém quer saber dos problemas do mundo e de como nos podemos juntar em ativismo para os tentar diminuir, nem que seja um bocadinho? Surtem algum efeito, estas palavras? Levantam alguém do sofá? Mobilizam uma alma que seja? Gostava de falar convosco! Temos lutas para fazer! Comunidades para criar e manter. Aumentar salários, defender o SNS, reivindicar uma escola pública melhor, exigir a Paz! Alguém acha que a vida melhora sem luta, sem mobilização? Alguém acha que a vida está boa como está? Quando deixámos de cuidar uns dos outros? De nos relacionarmos uns com os outros? De sentir as dores alheias?
Obviamente que não estou a falar dos meus textos ou das minhas dores, mas sim dos temas que abordo. Tenho falado de guerra, de violência contra mulheres e minorias, de caos climático, dos efeitos do preconceito na vida das pessoas que nos rodeiam… temas pesados e difíceis, que deviam gerar algum tipo de empatia, raiva, revolta e, acima de tudo, envolvimento.
Nada disso tem chegado até mim. Não sinto pulso desse lado. Faz sentido continuar aqui? Estas palavras servem para alguma coisa? Quero ouvir-vos! Ler-vos! (vou continuar, fico à vossa espera!) Está aí alguém?
Texto escrito segundo as regras do novo Acordo Ortográfico de 1990
