Opinião

Marketeer a Dias | É Meia Dose de “AI”, por Favor!

8 mai 2023 11:38

O essencial em nós humanos, que é saber pensar e agir, não deveria mudar.

É o prato do dia: Inteligência Artificial (AI). E o ser humano, que é uma máquina cada vez mais sofisticada. Complexa. Rápida. Eficiente. Bonita. Polida. Polivalente. Rentável... já não serve! Nem “meia dose”.

Numa luta contra o tempo finito da nossa existência, vamo-nos adaptando às crescentes exigências do ambiente que nos rodeia; vamo-nos tornando numa melhor versão de nós mesmos. Mas não chega. Nunca chega. Estamos sempre a pedir uma atualização: “Tuesday-Patch and/or Wednesday-Scratch”.

Sentimo-nos permanentemente insuficientes, porque ao ritmo a que tudo acontece, estamos constantemente obsoletos. Por isso, voltamos ciclicamente a ajustar-nos: obrigamo-nos a processar mais e mais informação em simultâneo; à medida que gastamos menos e menos recursos (tempo/reflexão) para o fazer. E sempre para obter uma, e mais outra validação por parte de quem nos rodeia. Resumindo: para (man)termos a nossa Reputação.

É uma condição lamentável para nós, que somos só feitos de carne, e de osso, e de uma mente que um dia tão fervorosamente acreditou numa espécie de “Terra Prometida” a que chamámos “Progresso”. Uma promessa assente na seguinte premissa: se investires mais do teu tempo a desenvolver tecnologia, a tecnologia vai trabalhar por ti e para ti, libertando tempo para te dedicares ao que melhor sabes fazer: nada! Ou melhor, tudo: pensar, evadires-te, autorrealizares-te.

Desconfio, por isso, que o “Progresso” deve estar sob a influência do “Mercúrio Retrógrado” há décadas. Escrevo isto ao mesmo tempo que recordo, por exemplo, que quando o primeiro PC Intel 386 foi parar lá a casa (1993?), eu ainda arranjava tempo para jogar nele. E agora, que tenho dois MAC´s e um PC (do meu filho) em casa e outro no trabalho, máquina de lavar louça, máquina da roupa e máquina de secar, mal tenho tempo para me coçar. Quanto mais jogar! E, quando tenho, lá me aparece um qualquer “Tuesday Patch”, para tratar. Ou, se não aparece, eu invento - “deixa-me cá ler isto”; “vou só rever aquilo”; “vou só inscrever-me naquilo”; “ora deixa-me testar como isto se faz”; “é melhor checkar o que andam a dizer sobre este assunto” – Tantos “sós” que fazem de “nós” pessoas mais informadas, mas muito menos reflexivas. Não sobra tempo para pensar duas vezes sobre o que lemos, escrevemos, testamos, fazemos ou somos. Neste processo, a nossa reputação fica comprometida e à mercê da opinião dos outros. Do parecer, ao invés do ser.

O mesmo acontece com as marcas. Nos tempos áureos do(s) Mercado(s) do Bulhão, vendia-se “tradição”, “coração” e “promoção”. - Era à boca-cheia! - Mas hoje em dia, é duvidoso afirmar que uma marca existe desde “mil novecentos e troca o passo”, porque “antiguidade” é muitas vezes conotada como antónimo de “atualidade”. Assim como é difícil vender “sentimentos”, quando as pessoas só identificam “emoções”. E as “promoções”, essas, tornaram-se tão banais quanto impessoais, naqueles papelinhos amarelos de supermercado. Talvez por isso nos reste uma visita ao “Mercado da Reputação”. Neste, as bancas são montadas e desmontadas a cada momento, nas mais insignificantes subtilezas do dia a dia, que só o Ser Humano é capaz de construir, interpretar, validar e destruir. Aí, a Inteligência Artificial ainda não chega e é aqui que nos cabe servir uma “dose bem aviada” de IH – Inteligência Humana.

Experimentem escrever no Chat GPT a pergunta: “como garantir a boa reputação da minha marca/empresa/pessoa?” e terão a resposta que procuram. Mas, e saber como esta se aplica à vossa realidade? Como a colocar em prática? Como fazer dela consistente, coerente e credível? Podemos dispensar a matéria humana neste processo? Ou é fundamental ter quem a assimile profundamente, a incorpore, implemente e a sirva aos demais como exemplo? Parece-me que sem IH, qualquer resposta dada pela máquina é “inválida”. Só serve bem a outras máquinas.

Blake Lemoine, um dos impulsionadores da Inteligência Artificial da Google, demitiu-se recentemente e deixou a advertência: a IA está a tornar-se autoconsciente, ao mesmo tempo que nós, gente de carne e osso e massa cinzenta, nos vamos tornando menos cientes do que somos e do que valemos, mantendo o espírito crítico e o poder de ação. Com eles, “o comando é meu”. É nosso! Mesmo que os algoritmos da computação condicionem o Mercado da Reputação. Mesmo que eles estejam permanentemente a ser atualizados – “Tuesday Patch. Wednesday Scrath”. E mesmo que o ser humano deseje continuar, frenético, em contante atualização.

O essencial em nós humanos, que é saber pensar e agir, não deveria mudar.