Opinião

Música | Dez

12 fev 2022 20:00

Mais do que tímidos apoios à sobrevivência aqui ou ali apregoados, os profissionais da cultura querem trabalhar

Passaram dez anos desde que os Nice Weather For Ducks lançaram o disco de estreia Quack! e a Omnichord tomou forma. Passaram dez anos desde que várias bandas de alunos do ensino secundário se candidatavam às audições do concurso ZUS, entre as quais os First Breath After Coma e os The Rumbles (com elementos que passariam a ser conhecidos por Surma e Whales). Construiu-se caminho e o tempo passou a correr mas, muito mais importante do que recordar ou comemorar os dez anos que passaram é olhar para outros números dez com que nos deparamos.

Há dias a UNESCO revelou que o sector cultural perdeu, só em 2020, dez milhões de empregos e, por aqui, a aventura da Omnichord que tinha começado com a ideia de gravar e promover novos artistas de Leiria evoluiu, entre 2019 e 2021, para uma estrutura com uma equipa multidisciplinar com mais de dez contratos de trabalho com exalunos das escolas da região que agora são profissionais de cultura a trabalhar na nossa cidade.

Este trabalho sustentado de prospecção, capacitação, profissionalização e retenção de talento acaba por enfrentar desafios nunca antes vividos e, num mundo cada vez mais digital e onde o sector cultural parece ser a última das prioridades, esta equipa de sonho, sem perder o foco na música, viu o mercado nacional e internacional a fechar e tem centrado as suas iniciativas culturais nas escolas, nas comunidades e nos projetos culturais diferenciados.

Conhecemos os dados internacionais que apontam para dez milhões de empregos culturais perdidos em 2020, ainda não conhecemos os de 2021 mas atrevemo-nos a dizer que devem ser iguais ou piores e os primeiros indícios que observamos em 2022 não auguram uma verdadeira retoma do sector, antes pelo contrário.

Nesta altura de aniversário redondo e perante um contexto tão inóspito para o sector, as festividades centram-se no desejo de acreditar que a cultura é essencial, transformadora e pode (e deve) dar trabalho. E esta equipa de bravos jovens operários e resistentes volta a mais dez escolas com a iniciativa A Música Dá Trabalho e junta dez profissionais a acompanhar os 5ª Punkada (banda da Associação de Paralisia Cerebral de Coimbra) numa digressão por várias salas do país.

Não vai ser nada fácil mas estamos empenhados em passar por todos estes dez e sobreviver. Mas mais do que tímidos apoios à sobrevivência aqui ou ali apregoados, os profissionais da cultura querem trabalhar, querem implementar novas ideias, novos encontros, novos projectos e fazê-los circular. Das artes performativas às artes visuais, da arquitectura ao design, da literatura ao cinema. E isso vai gerar saber, reflexão, exploração, bem estar e, directa e indirectamente, estimular muitos outros sectores e repercutir positivamente em quase todos os aspectos do nosso dia a dia de amanhã. E estou convencido que o território e as populações precisam cada vez mais disso. Oxalá cada vez mais gente se convença disso. Não são apenas os profissionais da cultura que agradecem. É o nosso presente e o futuro dos nossos filhos.