Opinião

Música | Os dias da rádio

9 abr 2022 08:59

O mundo tem muito mais graça com uma balada do Fernando Daniel pela manhã e uma canção dos Velvet Underground pela tarde. E Rachmaninoff a qualquer hora

Ouvir a rádio, ou o rádio, nunca percebi bem o género, continua a ser um hábito dos portugueses, li eu algures num desses estudos da Marktest, principalmente através do auto-rádio. Mas, atenção: ouvir emissões radiofónicas no computador, telefone ou mesmo na televisão, está a ganhar terreno. E é impressionante ver as audiências dos programas da manhã de uma Rádio Comercial ou RFM: mais de 1 milhão de pessoas acompanham diariamente as emissões, o que por isso não é de espantar a quantidade de publicidade.

Tenho as minhas preferências radiofónicas, mas por questões profissionais, vou ouvindo, aqui e ali, quase todas as estações sintonizadas no auto-rádio. Claro que a minha filha impõe as suas preferências e a rádio eleita das manhãs é a Comercial. Com apenas 8 anos, a filhota gosta de ouvir o Markl e companhia, mas gosta principalmente do air play da estação com os hits nacionais e internacionais do momento: Fernando Daniel, Bárbara Tinoco, Carolina Deslandes, Carlão, Diogo Piçarra, Rita Rocha, Rosalía, The Weeknd, Shawn Mendes, Imagine Dragons e por aí afora. E, se há uns anos, eu não fazia a mínima ideia de quem eram estes artistas, agora sou um rapaz muito mais informado e já sei quem são os músicos que ganham os prémios MTV, Grammy, etc… e também os músicos portugueses que giram à volta dos programas do género The Voice e enchem Coliseus, coisa que parece normal nestes dias.

Quem eram os artistas portugueses que enchiam um Coliseu há 20 anos? Certamente poucos, agora temos o Zambujo e o Araújo a fazerem 28 noites na sala mais emblemática de Lisboa: é obra! Mas eu aplaudo tudo isto, mesmo não gostando particularmente deste ou daquele músico, parece haver, finalmente, uma indústria musical em Portugal, e já nem falo do Tony Carreira, que é ele próprio uma indústria, à boa maneira sul-americana, com partilha de cancioneiro entre uns e outros: vai buscar esta guitarra ali, um verso acolá e sai música a metro para a clientela.

Não é por isso de estranhar, com tanta rádio, que o algoritmo do meu Spotify se baralhe e tenha dificuldades em sugerir músicas: é que as minhas playlists podem ter a Beyoncé ou Billie Eilish, que eu tanto adoro, os Spiritualized, Neu!, Bandua, Gustav Mahler ou os Burning Ghosts.

Já lá vão os tempos das escolhas selecionadas e armadas ao pingarelho, o mundo tem muito mais graça com uma balada do Fernando Daniel pela manhã e uma canção dos Velvet Underground pela tarde. E Rachmaninoff a qualquer hora.