Opinião
Na ressaca dos três F
Nos tempos idos da ditadura de Salazar identificavam-se Fátima, o Futebol e o Fado como elementos primordiais da distração (alienação para alguns intelectuais) do povo em relação à governação.
Na verdade, o Fado era tido como o parente pobre da canção, acusado de nada contribuir para a elevação cultural e social do país.
Fátima, por sua vez, era o crescimento desenfreado, enriquecimento sem regras, em que tudo se trocava por dinheiro, inclusivamente copos de água «da torneira» vendidos, a preço de ouro, aos peregrinos.
Fátima, em agosto de 1977, era ainda uma aldeia, e, em menos de vinte anos (julho de 1997) era elevada a cidade.
Por fim, o Futebol era praticamente o único entretenimento das massas que vivia no anonimato e na insignificância a nível internacional e passou a viver num certo sebastianismo a partir de 1966.
Surpreendentemente, eis que, meio século depois e num ápice, ou seja, em pouco mais de um ano, Portugal inverte, radicalmente, as conotações do trinómio Fátima, Futebol e Fado.
Volvida a primeira metade da segunda década do terceiro milénio reinventámos, quase subitamente, Portugal e a nossa identidade.
Com as comemorações dos cinquenta anos de carreira, Carlos do Carmo, o nosso «Frank Sinatra» do Fado, um senhor, que assumiu o estatuto de senador da cultura a par de Ruy de Carvalho e fadistas como Marisa que fazem do mundo o seu palco, o Fado passou a pertencer à elite da cultura.
Na verdade, durante décadas, fomos o parente pobre e insignificante do panorama televisivo internacional ao nível da música.
Eis que, numa só noite, mágica, com Salvador Sobral (e a sua irmã Luísa), a Europa e o mundo passaram a «amar pelos dois» (Sobral) o nosso país, levando ao top do iTunes a nossa música cantada na língua de Camões.
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*Mestre em Direito Criminal e Direito Público