Opinião

Nada ou uma ferramenta para construir a vida

2 jul 2021 10:33

Afortunadamente, fui salva por uma outra professora: a pensar no meu futuro, essa ensinou-me e eu aprendi a comunicar em francês!

Sempre que tenho de usar o inglês para comunicar sinto que não tenho um saber em ação, isto é, sinto-me incompetente. E foi assim que ontem me senti quando ao receber duas eslovenas amigas do meu filho eu lhes quis perguntar sobre se era verdade que o corte do financiamento feito pelo governo do seu país à agência de notícias fosse uma estratégia para transformar os media públicos em órgãos de propaganda do regime.

Tive de recorrer à minha nora como tradutora das minhas perguntas, apesar de não ter qualquer tipo de dificuldade em compreender as respostas que as raparigas me deram em inglês. E sim, é uma realidade: no próximo país a acolher a Presidência do Conselho Europeu a liberdade de imprensa está ameaçada!

Felizmente, muitos eslovenos estão a financiar a agência de notícias e por agora estão a conseguir travar a ignóbil pretensão do governo de Janez Jansa. Mas, e voltando a esta minha incapacidade de comunicar em inglês atribuo-a à forma como antigamente se ensinava essa língua, mas não só! Ela deriva também da passividade da minha professora ao mostrar-se incapaz de antever as necessidades dos seus alunos no futuro. A forma como me ensinou, com recurso a centenas de retroversões e traduções de textos sem qualquer ligação a situações reais e quase sem conversação, fez-me aprender uma língua que apesar de viva a mim me surgiu como quase morta!

Reconheço que o mesmo possam não ter sentido os meus colegas amantes das letras e que mais tarde optaram pelo estudo dessa língua, mas bolas, eu era jovem e iria ter a necessidade de comunicar com o Mundo!

Afortunadamente, fui salva por uma outra professora: a pensar no meu futuro, essa ensinou-me e eu aprendi a comunicar com ele em francês!
E vem isto a propósito da minha concordância com a generalidade das propostas apresentadas no documento “Novas Aprendizagens Essenciais de Matemática”.

A juntar a tudo o que experienciei como aluna, era eu já professora há alguns anos quando, por causa do que estudava nos livros da especialidade e via acontecer nas aulas, comecei a ter a perceção de que, na matemática não só o que se ensinava, mas também o como se ensinava, era intelectualmente castrador para a maioria dos alunos e os tornava futuros cidadãos incapazes de usarem o raciocínio matemático como ferramenta na construção das suas vidas.

Lembro-me até de uma colega que discordava desta minha análise me ter dito que afinal eu tinha razão! Mudou de opinião quando os seus netos ingressaram no 1º ciclo e percebeu como neles se tinha esvaído o gosto pela resolução de problemas semelhantes aos que ela lhes colocava e eles resolviam com recurso ao cálculo mental.

Confesso que após ter estudado o relatório “Recomendações para a melhoria das aprendizagens dos alunos em Matemática” e ter lido as duras críticas que lhe estão a ser feitas pela Sociedade Portuguesa de Matemática (SPM), me apetece revisitar o meu passado e dele fazer emergir algumas comparações.

Na SPM vejo a minha professora de inglês! Nos matemáticos que produziram o documento “Novas Aprendizagens Essenciais de Matemática” eu vejo a minha professora de francês. O que querem? Tenho de comparar aquelas ajudinhas que um programa desajustado e uma professora limitada me deram para me tornar incompetente na comunicação em língua inglesa com o que a SPM tem andado a fazer por aí…

Texto escrito segundo as regras do Acordo Ortográfico de 1990