Opinião

Nos 500 anos da viagem de Magalhães

14 nov 2019 12:27

Volvidos 500 anos, no passado mês de setembro, sobre a partida de Fernão de Magalhães para a 1.ª viagem de circum-navegação que “tornou” a Terra redonda, aparecem vários escritos sobre esse feito extraordinário perpetrado por um português – mesmo que ao serviço de Carlos I de Espanha.  

Como escolher qual ler? Como que por encanto – tal qual acontece nas histórias maravilhosas – encontrei, na Feira de Antiguidades, o romance Fernão de Magalhães escrito por Stefan Zweig em 1938, numa 6ª edição da Livraria Civilização, 1945, e traduzido por Maria Henriques Osswald, que usa a ortografia anterior ao acordo ortográfico de 1945. Por um euro!  

Em jeito de prefácio(s), o livro conta com Só algumas palavras da tradutora, que faz a apologia do brilhantismo de Zweig paralelamente com o de Magalhães, e com uma Introdução pelo próprio autor em que explica como nascem os livros, nomeadamente este «que resultou do sentimento vergonha». Vergonha porque ele estar a fazer uma viagem de barco à América do Sul com todo o conforto e toda a segurança e tendo-se posto a lembrar-se de como tudo se passava antigamente, no tempo das naus.

«Pensa naqueles aventureiros que descobriram êstes mares portentosos e envergonha-te. Procura imaginar como eles, nos tempos de antanho, se aventuravam nas frágeis embarcações em demanda do ignoto, sem conhecimento algum da rota a seguir, perdidos na imensidade, expostos sem cessar ao perigo, ininterruptamente abandonados às surpresas das intempéries e ao martírio de todas as privações.»

Admirável este seu assombro por esses heróis, como admirável foi a investigação em que o autor teve de se lançar para conseguir descrever de forma meticulosa todo o envolvimento dos portugueses nas descobertas desde a Idade Média, a sua atração pelo mar e pelo Oriente, até começar a falar do navegador Magalhães desde os seus feitos na Índia (1505) para delinear a sua maneira de ser e de pensar – o orgulho era o seu principal defeito – que, repudiado pelo seu rei, foi oferecer os seus serviços ao país concorrente.

Não se trata de um simples romance histórico, mas sim de um relato minucioso de uma viagem sem precedentes, «talvez a mais extraordinária odisseia na história da humanidade, esta expedição de 265 homens decididos, dos quais só regressaram 18 no navio desmantelado». Dá vontade de o comparar com as crónicas de Fernão Lopes, que a partir da leitura de documentos, consegue dar um retrato real, uma quase filmagem dos tormentos sofridos pela tripulação ao longo daquela tremenda viagem.

Stefan Zweig, (1881 – 1942) judeu austríaco, um pacifista por natureza e por educação, foi um dos grandes escritores europeus do século XX que se distinguiu no romance, nas biografias, na novela, no teatro e no jornalismo, nomeadamente entre as duas guerras mundiais. Com a reedição da sua obra Fernão de Magalhães e outras pela Assírio e Alvim, parece renascer o interesse pela leitura daquele brilhante intelectual.

Texto escrito segundo as regras do Acordo Ortográfico de 1990