Opinião

Núcleo da claridade

19 nov 2020 14:57

Evoco o título de um livro da autoria de Duarte Belo, filho do poeta Ruy Belo, sobre a vida e carácter fragmentário do que persiste para além da construção de um desígnio

Um olhar de alguém que viu o seu pai partir aos 10 anos, nessa vaga viagem da procura do território unicamente humano. O futuro de todos nós começa a ser ampliado muito precocemente, nos territórios da infância.

O ambiente educacional é o facilitador, fornecendo vários recursos para ajudar a desenvolver o potencial de cada um, configurando novas oportunidades para o progresso no desenvolvimento.

As abordagens psicológicas projectadas para potenciar os pontos fortes de cada pessoa (como a coragem, uma visão prospectiva do futuro, as competências interpessoais, a perseverança e a capacidade de autorregulação emocional), são determinantes, funcionando como amortecedores contra a psicopatologia.

Paradoxalmente, Joseph Joubert, ensaísta francês que viveu no século XVIII, acreditava que a doença sintonizava a alma. É sua a frase belíssima que nos diz que “a esperança é um empréstimo que se pede à felicidade”.

O conceito de esperança remete para o (re)estabelecimento de metas concretas, para a configuração de estratégias e soluções para alcançar objectivos, consolidando impulsos para que ensejos se tornem realidade.

Pensar na esperança como um processo que integra ideias e energia para o futuro confere-lhe uma poderosa dimensão preditora da eficácia e do sucesso. As escolhas são influenciadas não apenas pelas oportunidades, interesses e valores, mas também, pela virtude da esperança – a clarividência. Aprender a persistir na adversidade, fazendo escolhas adaptativas em relação ao futuro, ainda que imersos em contrariedades e infortúnios do passado ou do presente, é uma competência vital.

A esperança não é um fenómeno emocional passivo que ocorre apenas nos momentos mais sombrios, tendo por mote a expressão “faz figas e torce pelo melhor”. É um processo cognitivo que pode ser ensinado e modulado.

É uma força humana que envolve capacidades como a motivação, a consciência, a determinação, a resiliência e o optimismo. E nem sempre é disfuncional renunciar a metas.

A redefinição de objectivos é, nalguns casos, uma opção ideal em si mesma, uma estratégia de superação e reajustamento.

As crianças com maiores níveis de esperança são mais criativas, têm melhores resultados académicos, melhores habilidades sociais, maior autoestima, sentido de autorrealização, enfrentamento activo das contrariedades.

A percepção de eficácia que adoptam é guiada pela abertura a novas experiências, ao invés da intolerância à frustração. A esperança não é uma virtude intangível, nem um despropósito.

É como os destinos de uma viagem: não há um só rumo ou caminho; para que o destino se alcance, diversos serão os andamentos imprimidos pelo viajante no rumar da trajectória.

Cada gesto de esperança entreabre horizontes imprevistos e infinitas possibilidades. O futuro é absolutamente amplo. Diverso.

Edificado pelos sentidos de todos os que estão dispostos a esperar.

Talvez a esperança seja uma espécie de poesia da desventura, um mapa que configura o curso do destino, mesmo que por via da suplantação dos embaraços que nos interpelam no caminho.