Opinião

Onde está a felicidade?

19 jan 2017 00:00

Recorrendo a uma palavra de Fezas Vital, estamos a criar 'carneiros' que encaixem no mundo existente, com a nova geração, na generalidade, a não ser educada para pensar, para ser autónoma, para transformar o mundo.

Não estamos a educar a actual geração para ser feliz, mas para cumprir objectivos e atingir metas que não lhes trazem felicidade”. A frase é de Frederico Fezas Vital, entrevistado do Jornal de Leiria nesta edição, que se dedica a fazer sonhar crianças em avançado estado de doença, tendo abandonado uma vida profissional monetariamente confortável, que passou pela advocacia e pela banca.

Fezas Vital argumenta que “há coisas que não se compram com dinheiro e com sucesso profissional”, percebendo-se pela sua opção pelo empreendedorismo social de que 'coisas' está a falar. Pelas suas palavras é evidente que se sente mais recompensado e feliz a intervir junto de pessoas fragilizadas do que na 'guerra' do dinheiro e do poder tão associada à banca e à advocacia.

Ganha menos, mas recebe mais e sente-se mais rico. Para isso, no entanto, teve que romper com o que está instituído como objectivo de vida no Mundo Ocidental, que passa muito por um conceito de sucesso ligado ao dinheiro, ao poder, à aparência e à posse. Não é necessário andar muito atento para perceber a glorificação desse tipo de sucesso, nomeadamente por parte da comunicação social.

Além das listas e rankings que surgem regularmente a dar conta das maiores fortunas, dos mais poderosos, dos que mais vendem e que têm maior influência, foi criado um culto à volta das excentricidades que só o dinheiro pode comprar. Se pensarmos um pouco, facilmente chegamos à conclusão que os carros de luxo, as mansões tipo castelo, as joias de muitos milhares e as viagens a locais paradisíacos com que músicos, actores, empresários e desportistas de topo tentam mostrar o seu êxito e felicidade, têm incomparavelmente mais tempo de antena do que projectos de solidariedade e de filantropia.

Obviamente, a mensagem vai passando, enraizando-se na sociedade uma forma de pensar e de sentir muito direccionadas para essas questões, com as pessoas a deslumbrarem-se e a terem como referências de vida o que essa minoria conseguiu e ostenta.

Recorrendo a uma palavra de Fezas Vital, estamos a criar 'carneiros' que encaixem no mundo existente, com a nova geração, na generalidade, a não ser educada para pensar, para ser autónoma, para transformar o mundo. E a verdade é que este mundo necessita rapidamente de uma transformação, de quem o pense de outra forma que não sob o prisma frio da tabela de Excel e perceba que a vida não se esgota nas metas e nos objectivos individuais.

A continuarmos por este caminho, feito de individualismo e de indiferença, o mais provável é que se agravem os problemas sociais, principalmente junto de pessoas mais fragilizadas, seja pela falta de meios, seja pela doença, seja ainda pela idade. No futuro poderá ser qualquer um de nós a viver a solidão trancado numa casa ou a ficar 'esquecido' meses a fio num hospital – problema que abordamos nesta edição -, enquanto os nossos descendentes procuram alcançar as suas metas e os seus objectivos, nunca muito distantes de um emprego com estatuto e bem remunerado, uma boa casa e um carro de alta cilindrada.

*Director