Opinião

Pai, falta muito?

16 jun 2016 00:00

São 22:30, parece que passámos o dia a ser atropelados e no fundo até foi. Voltem avós estão perdoados. Agora é voltar ao trabalho para ver se temos algum descanso.

Férias com os putos. A expressão tem a palavra férias, mas seguida de com e putos todo o seu significado, de descanso tranquilizante, é aniquilado. Pior que partir em direcção a uns dias de repouso com duas crianças só mesmo com três ou mais. É tão espectacular que até se pode considerar uma coisa contraceptiva.

Dois dias antes da partida a operação logística arranca e assemelha-se à ida de um batalhão para a guerra. Sopas congeladas, roupa para todo o tipo de clima, termómetros, aparelhómetros, uma banheira e uma cama de viagem, que são mais pequenas do que as outras mas mesmo assim grandes demais para um carro normal. Lá temos nós de fretar a carrinha do avô, tem mais espaço, e portagens e gasóleo muito mais em conta.

Supositórios, fraldas, toalhetes, protectores solares, cremes hidratantes, emulsionantes, cremes para o caso dos outros cremes falharem, esterilizador, biberons, leite em pó, um duende, o santo graal e uma ferradura numa pata de coelho com um trevo de quatro folhas embutido. Tentamos com muita força não esquecer nada mas ao chegar vamos reparar que não trouxemos babetes. Ou cotonetes, raio dos cotonetes nunca vão.

A ideia era arrancar bem cedo. A viagem começa. São 11 horas. Passamos a portagem e sai lá de trás o primeiro de muitos: “Pai, falta muito?” Falta um bocadinho, filho. Para aí umas 3 horas. É num instante. Dorme um bocadinho, passa mais depressa. Dessas três horas a mãe passou uma com um joelho no banco da frente e uma perna no banco de trás. A concertar a chupeta, a apanhar a bola, a tapar um dos vidros, a ver se a menina dormia, se o miúdo sossegava.

Muita M80 depois lá chegamos (um dia destes abro uma rádio nacional em que o slogan é: “Só passamos música que você não precisa de passar à frente”). O hotel é no meio do nada e está à pinha, famílias e famílias, parece um shopping, com um rácio altíssimo de Salvadores, Martins, Bernardos, Constanças e Matildes que torna óbvio o que o simples facto de tirarmos uns dias já me fazia parecer: estamos a viver acima das nossas possibilidades. Uma cerveja custar três euros e uma sopa quatro também é um forte indício. O resto é o que todos vocês com filhos sabem.

Acordar às 7, levantar às 7:30, dar pequenos-almoços, besuntar todos com factor 350, ir à piscina, relembrar com um ar nostálgico o quão bom era ler tranquilamente esparramado na espreguiçadeira, apanhar um susto com uma quase queda, dar de comer à mais nova, mudar fralda, dar de comer ao mais velho, ir comer a adormecer a princesa, adormecer o ninja que agora diz que é o homem de ferro, a miúda acorda, entretê-la, mais um biberon, o puto acorda. Sai mais uma camada de protector para todos. Voltar à piscina, uma sempre ao colo o outro sempre sob o olhar de uma dupla acabada de baywatchers. 18h, banhos, cremes, jantar à mais nova, jantar ao mais velho, embalar a menina, contar a história ao mais velho.

São 22:30, parece que passámos o dia a ser atropelados e no fundo até foi. Voltem avós estão perdoados. Agora é voltar ao trabalho para ver se temos algum descanso. “Pai, falta muito?” Para voltar a ter férias meu querido? Falta um bocado mas nós aguentamos.