Opinião
Quando o mundo pula e avança
Terminei há 15 dias o curso de Medicina. Com 44 anos
António Gedeão resume num poema o que é, para mim, a Ciência e o ser cientista.
Alguém que não só sonha, mas acredita no seu sonho e nele trabalha afincadamente, conseguindo, por vezes, fazer o mundo pular e avançar.
Desde a tela ao foguetão, como diz bem Gedeão. Mas a Pedra Filosofal fala, sobretudo, da vida de cada um.
Do que cada um de nós faz para o mundo pular e avançar. (Bem) Mais que os cientistas. Naquele metro quadrado à nossa volta de que somos responsáveis.
Terminei há 15 dias o curso de Medicina. Com 44 anos.
Não que fosse um sonho afincado que carregasse em mim desde longos tempos, mas, antes, uma circunstância. Que considero feliz. Muito feliz.
No sonho maior de ser cientista deparei-me com várias vicissitudes.
As bolsas de investigação pós-doutoramento não surgiam. As horas de explicações ao 3ª ciclo e secundário, de longe, não eram suficientes. A vários níveis.
Primeiro a realização pessoal. Depois a sensação de não estar a “devolver” todas as competências adquiridas no investimento que o país fez no meu doutoramento (ainda que soluções não tenha para todos os seus doutorados).
E tudo isto me levou a que um dia, literalmente, acordasse e pensasse “tenho que fazer algo para mudar isto. Vou concorrer a Medicina”.
E assim fiz. E durante seis anos viajei diariamente entre Leiria e Lisboa para fazer o curso.
Caricatamente, assim que o comecei, comecei também a trabalhar no Politécnico de Leiria.
Reconheço, e agradeço, aqui, publicamente, a abertura e a visão desta instituição.
Não só para acomodar os ajustes de horário e demais direitos de uma trabalhadora-estudante, mas sobretudo por perceber as vantagens que o seu enriquecimento académico e profissional trariam para a instituição.
Não vos falo de mim num registo egocêntrico. De longe.
Falo-vos antes como exemplo do que por vezes parece impossível mas não é (o que também não quer dizer que não implique grandes sacrifícios e múltiplas abdicações, de várias coisas que, por vezes, muitas vezes, não conseguiremos, nunca mais, recuperar).
Li uma vez um artigo de que não me esquece o conteúdo (mas não recordo o autor, perdoe-me). O que dizia é que é no cemitério que se encontram as melhores ideias e sonhos.
É uma imagem muito explícita, de tão dura que é. E, por isso, há que viver os sonhos e concretizar as ideias!
Guardá-los de nada serve. E é por isso que, depois do curso feito, vos deixo este testemunho. De que o sonho comanda realmente a vida.
Mas nunca o alcançamos sozinhos. Impossível pensar que o fazemos sozinhos. Se para educar uma criança é preciso uma aldeia, para atingir sonhos também.
Agradeço portanto, sobretudo, muito, à minha aldeia, a minha família, o tanto que sacrificaram também, comigo, nestes últimos seis anos.
Foi duro, muito, mas valeu a pena. Que valha a pena também para vós seguir os vossos sonhos e concretizar as vossas ideias.
Boas férias, bons sonhos e ainda melhores concretizações! Vamos lá fazer o mundo pular e avançar!
“Como bola colorida, nas mãos de uma criança”…
Texto escrito segundo as regras do Acordo Ortográfico de 1990