Opinião

Queixinhas, parte número dois: os professores

3 jul 2018 00:00

Os professores são sempre figuras marcantes no nosso crescimento.

Na maior parte das vezes, de uma forma positiva, cuja manifestação máxima sempre foram aqueles professores fixes, que dominavam a matéria, mas que tinham os seus momentos de Humanidade e fumavam um cigarro connosco ou bebiam uma cerveja. 

Depois, havia outros, mais rigorosos talvez, mas que nos impunham uma virtuosa ordem, chegando e estimulando as nossas faculdades escondidas pela rebeldia jovem que nos colocava  desafios bem menos académicos.

Todavia, e seguindo o espirito dos tempos, dos que nos lembramos mais era dos que faltavam imenso, dos que eram arrogantes como o caraças, que detestavam ensinar e cuja pouca paciência para os alunos e para “aquilo”, permitia concluir que estavam ali ou de passagem ou à falta de melhor coisa.

Penso que muitos dos textos e comentários que têm vilipendiado os professores e tornado a sua imagem pública numa verdadeira desgraça, estarão completamente infetados de ressentimento, de rancor guardado para com os maus professores que sabemos representarem uma minoria da sua classe, mas que mesmo assim fazem muita mossa e, na verdade, dominam um pouco as atenções da opinião pública, moldando-a no processo. 

É nessa condição e debaixo de uma visão opressiva que os Professores lutam há anos pelos seus direitos, não se preocupando, com a imagem pública em prol de um objectivo definido pela grande maioria dos professores que são sindicalizados e que, ao contrario de outras classes, agem e conseguem modificar, mantendo a personalidade da sua união. Nunca baixando os braços.

Se os 600 milhões de euros previstos para gastar com as exigências salariais dos professores com que o Primeiro Ministro veio assustar o povão, são montante de respeito, há que salientar que este gasto será feito progressivamente (20 a 30 anos) e que não pode, de todo, ser confundido ou comparado com os negócios ruinosos do Estado com a Banca.

Devemos começar a olhar para a Educação como um investimento e se os professores em 2018 são a ainda os alicerces humanos do ensino, não devemos lamentar nunca esse investimento, nem chorá-lo nos jornais. Haverá retorno, mais cedo ou mais tarde, se houver paciência e confiança.

Em vez de listarmos e olharmos para as vitórias dos Professores e dos seus sindicatos como resultados de chantagem social, devíamos olhá-las como exemplos, com todas suas virtudes e defeitos, como um sinal de que a coragem, a persistência, a fidelidade a uma causa não tem que ter sempre final infeliz em Portugal.

Se nos parece que a greve às avaliações nos é prejudicial, é porque ela nos é prejudicial. Se assim não fosse, de que serviria uma greve afinal? Quem diz o contrário, habituado ao soft promo das televisões e jornais, é reacionário na forma como quer retirar sentido, poder e acutilância a um dos instrumentos mais democráticos do sistema, por quem tanta gente deu a vida, a familia, o estatuto. 

Em vez de comentarmos como os burgueses que somos, devíamos atentar ao facto de que é mentira que os professores sejam chantagistas sociais e que tudo isto seja um mero capricho da classe.

Toda a luta contra horários injustos, salas aquecidas e preparadas para o século XXI, avaliações, a contagem do tempo de serviço, é uma luta justa. E só se tornou numa luta através dos anos, porque reage contra uma classe política e suas decisões que, sazonalmente mudam com a cor política, baralhando para dar outra vez.

As invenções políticas, essas sim, são claras como água na sua intenção de minimizar recursos, alterar caprichosamente as regras, e por aí fora, conforme demonstrado e documentado, acessível  a todos, menos a quem esteja de mal com os seus antigos e faltosos professores. 

Se os professores gozam hoje de melhor condições que a maioria dos funcionários públicos é porque respiraram fundo, contaram armas e foram à luta. Para variar, em Portugal, ditaram condições e conseguiram. Nada que seja impedido, por lei ou por crença, a qualquer outro funcionário público.  

É errado e irresponsável dizer que os professores não estão do lado da paixão pela Educação. Esta luta, este sentido raro de responsabilidade e de conquista, prova exactamente o oposto.

É tempo de deixarmos de imediato o trauma que tivemos com alguns professores ditar o sentido das nossas observações e comentários maldosos sobre o caso de sucesso de reivindicação que  os nossos professores são. É tempo de encaixarmos socialmente as conquistas dos professores, de não extremarmos as nossas posições.

De não acreditar que a meia-dúzia de miúdos nervosos perante uma câmara a não localizar Portugal no mapa sejam uma amostra representativa dos nossos alunos que ganham Olimpíadas de Filosofia e Matemática, fora dos radares mediáticos.

É tempo de deixar os Professores ensinarem.

É tempo de aprender. 

*músico e líder dos Moonspell