Opinião
Queixinhas parte número um: o Rui Patrício
Nós todos cá do alto da nossa famosa resiliência Portuguesa olhamos, regra geral, com constrangimento para o queixume e de forma genérica, odiamos quando alguém, por outra palavras, conjuga esse verbo, reflexivamente, queixar-se.
Daqui, à falta de melhor sítio para observar, não nos importa muito o meio utilizado para desfiar o rosário. Não nos cingimos a detestar quando é feito apenas nas redes sociais, odiamos também quando um amigo se queixa numa ocasião de copos, conversa de jantar, não há pachorra para isso.
E isto é quando é um amigo, fará um estranho ou melhor ainda alguém de sucesso e fama, que se atreve a contar os seus padecimentos.
Existe uma razão para isto, para este desdém que talvez seja mais poderosa que todas as outras: a sensação de que temos sempre uma historia ou que estamos numa situação pior do que a pessoa que está a contar a sua.
Logo, uma superioridade moral que conduz ao nosso desprezo ou falta de simpatia perante quem “desabafa” ou “protesta”. É, talvez verdade, que as gerações anteriores se queixavam menos. A ditadura, a repressão, o medo, mas, todos nós, desde os anos 70, temos aproveitado, nem sempre bem, o púlpito popular ao qual subimos.
Muitas vezes, para nos queixarmos, é verdade. Num espetáculo muito antigo de comédia os Monty Python tinham um sketch para ver quem era mais pobre, ou o mais coitadinho de todos.
O opositor na contenda pelo mais miserável chamava-se Rowan Atkinson (Mr. Bean) e, como sempre, deu muita luta. No rescaldo da competição pelo mais pobrezinho já se encontravam todos a partilhar moradia na sola do sapato que era a única propriedade de um deles.
Posto isto, imaginemos que um dia qualquer, um bando de hooligans nos entra pelo escritório da empresa adentro e nos desata a ofender, a encostar à parede, a ameaçar. Depois, dá-nos nos cornos e foge, deixando um rasto de confusão e caos à sua partida.
No meio da confusão, apercebemo-nos que eles estão ali porque a nossa empresa falhou com os seus objetivos (acontece mais do que o que se pensa). Não ganhámos aquilo. Nem atingimos o resultado proposto.
Quando regressamos a casa, depois do Hospital, começamos a juntar as peças e verificamos que desde que o CEO da nossa companhia, afirmou publicamente que a culpa do falhanço não era da liderança mas dos empregados, roendo a corda de confiança que nos tem de ligar a um líder, que a nossa vida pessoal foi acossada, que, de repente, o ambiente se tornou pesado e vingativo.
Que custava ainda mais ir trabalhar. Enquanto pomos gelo nos hematomas, juntamos mais umas peças. Mas, merda, amanhã temos de ir trabalhar. E temos um negócio importante daí a uns dias e…falhamos outra vez.
Nada mudou, a não ser haver agora violência nas nossas vidas mas ao que parece isso não conta como “desculpa”. Começam a apontar-se dedos. Ficamos com ainda mais medo. Pensamos na nossa vida, na nossa familia e nos nosso direitos.Não dormimos porque cogitamos no silêncio.
Concluímos que a segurança no local de trabalho é da inteira responsabilidade da nossa empresa. Mas, que mesmo assim, levámos na boca. Revoltamo-nos e agimos, porque somos bons profissionais afinal, e, como manda a Lei, fazemos cartas de rescisão, escritas com detalhe e verdade, apontando culpas, mas apresentando factos inegáveis, confiando no bom senso dos nossos clientes e relações.
Documentos legais e transparentes. Aqui é que nos lixamos. Aqui é que começamos a ler no Twitter e a ouvir nos cafés, que o Rui Patricio parece que esteve na Síria. O guarda-redes que tantas vezes salvou a sua equipa e ainda por cima a equipa de todos nós, a Selecção, no Europeu, afinal é um mimado que não quer levar porrada e vai bazar assim, sem “mais nem ontem”.
A mim, agora, só me apetece fazer uma pergunta: O que faríamos nós nesta situação? Se isto nos acontecesse? Nós que, pelos vistos, nos conseguimos sujeitar a tudo e continuar com a nossa vida como se nada fosse. Quem souber que me responda.
Acho que o Rui Patrício e todos os jogadores que vão rescindir com o Sporting por justíssima causa também gostariam de saber.
Nota: Esta é a primeira parte de uma série de artigos aqui no Jornal de Leiria. Parte número dois: os Professores
*músico e líder dos Moonspell