Opinião
Rir para não chorar (outra vez)
É, de facto, uma vergonha, que chegados aqui, a caminho de celebrarmos 50 anos do fim de 48 anos da obscuridade de um regime criminoso, ainda tantos continuem a pensar tão pequenino
Novo mês, novo texto, os mesmos “problemas”.
Ia aqui lançado para completar a lista de séries que deixei a meio na última crónica, quando me apercebo de que corre pela Internet (e seguramente que também pelos cafés, praças de táxis e outros apeadeiros da mais polida sabedoria institucional portuguesa) uma exaltada onda de indignação pela nomeação de uma equipa liderada por Pedro Adão e Silva para organizar as comemorações dos 50 anos do 25 de Abril.
Tal indignação - "uma vergonha”, como adoram dizer vocês-sabem-quem - prende-se com o aparentemente milionário salário mensal do coordenador da equipa (4.500 euros brutos), com o tamanho da própria equipa (“uma máquina composta por três adjuntos, três técnicos especialistas, um secretário pessoal e ainda um motorista”, li algures) e ainda com a duração do contrato deste diabólico ensemble que, de acordo com os grandes sábios do ciberespaço (e não duvido que os seus pares dos cafés, praças de táxis e demais apeadeiros da mais polida sabedoria institucional portuguesa partilhem da mesma aguerrida “opinião”) se prepara para não fazer nada durante os próximos cinco anos.
Como é óbvio, qualquer um dos brilhantes indignados não só organizaria muito melhor estas comemorações dos 50 anos de Abril que Adão e Silva e a sua máquina socialista de esbanjar fortunas, como o faria em apenas dia e meio e, obviamente, de borla, como qualquer organizador de eventos que se preze.
Que é lá isso de cobrar para trabalhar? Com tanto talento organizativo à espera de ser aproveitado, como é que um governo se atreve a contratar alguém e a dar-lhe condições para pensar e fazer uma coisa que, como qualquer evento cultural em Portugal, se pode fazer à base do desenrasca?
Não conheço o Adão e Silva de nenhum lado (só sei que, como eu - e, já agora, o Tolentino Mendonça -, é fã dos Belle and Sebastian), nem faço a mínima ideia do que serão estas comemorações.
Presumo que estou exactamente na mesma posição que estes excelsos indignados. Mas que isso não impeça ninguém de gritar a plenos pulmões: “É uma vergonha!”.
É, de facto, uma vergonha, que chegados aqui, a caminho de celebrarmos 50 anos do fim de 48 anos da obscuridade de um regime criminoso, ainda tantos continuem a pensar tão pequenino. Principalmente quando se trata de cultura e de Abril.
Não sei se neste caso consigo rir para não chorar.
E quanto às séries… fica para a próxima!