Opinião

Ser simplesmente

26 ago 2023 10:35

A tendência de todos nós é a da subjugação do indivíduo a categorias, o que favorece a estigmação e outros fenómenos de desigualdade e julgamento

Na linguagem comum, a palavra “pessoa” refere-se a um ser racional e consciente de si mesmo, com identidade própria. O humano na sua matriz singular, alicerçado em diversas especificidades existenciais. A pessoa é um ser social dotado de sensibilidade, com inteligência e vontade implicitamente ‘individuais’.

Na Psicologia falamos de indivíduo (o conceito abarca aspectos físicos e psíquicos do sujeito, que o definem pelo seu carácter particular e único).

No Direito, pessoa é a entidade ou organismo susceptível de cumprir deveres e obrigações. Por isso, se fala de diferentes tipos de pessoas: físicas (os seres humanos) e de existência ideal ou jurídica (as sociedades, as corporações, o Estado, as organizações sociais, etc.).

As pessoas físicas ou naturais correspondem a um conceito jurídico elaborado pelos romanos. Actualmente, pelo simples facto de existirem, dispõem de diversos atributos concedidos pela jurisprudência e pela função social, virtude cívica ou competências de cidadania que exercem. O que nem sempre é convergente com a função, ordem ou responsabilidades que adoptam.

No campo da Filosofia, ‘pessoa’ é um ser que possui capacidade de pensar, agir, racionalizar, detém autoconsciência, moralidade e espiritualidade. A característica que melhor distingue uma pessoa de outra é a capacidade mental de fazer escolhas, analisar situações, saber como solucionar problemas, tomar decisões ou integrar as estruturas funcionais e orgânicas da sociedade a que pertence.

Segundo Aristóteles todos os seres vivos têm alma, ainda que com distinções. As plantas teriam apenas uma alma animada pela função vegetativa, ao passo que a alma dos animais, teria além desta, uma outra - a sensorial. Já a alma dos humanos possuiria cinco disposições, por meio das quais poderia afirmar ou negar a verdade: a arte (téchne), o discernimento (phrónesis), a ciência (epistéme), a sabedoria (sophía) e o intelecto (noús).

Seja qual for a perspectiva - psicológica, jurídica, social, educacional, política, artística ou espiritual - a tendência de todos nós é a da subjugação do indivíduo a categorias, o que favorece a estigmação e outros fenómenos de desigualdade e julgamento.

Então, o que são verdadeiramente as pessoas? A genuína resposta, encontra-se no verso extraído das «Odes» de Ricardo Reis (Fernando Pessoa heterónimo): “Segue o teu destino, / Rega as tuas plantas, / Ama as tuas rosas. / O resto é a sombra / De árvores alheias”. Somos o que fica entre o ‘tudo’ e o ‘nada’, essência contida na falível autenticidade.