Editorial
Transportes pouco públicos
Sem passageiros, contra factos, não há argumentos
Imagine o seguinte cenário: está em Paris, é fim-de-semana, e apetece-lhe ir visitar a casa onde faleceu o mestre do pós-impressionismo, Vincent Van Gogh, que fica na pequena cidade de Auvers-su-Oise, a cerca de 30 quilómetros de distância.
Hoje, não será muito difícil arranjar um meio de transporte público para lá chegar, absorver um pouco mais da história do famoso pintor holandês, apreciar ao vivo algumas das paisagens que deixou imortalizadas na tela, e regressar à cidade Luz.
Mas há mais de 20 anos já era assim. Mesmo ao sábado ou domingo, bastava apanhar um comboio e depois um autocarro, para deslocar-se à pequena comuna (o equivalente à nossa freguesia), com pouco mais de 6000 habitantes.
Embora possa parecer descabido, este exemplo tem um propósito: chamar a atenção para a importância das políticas de mobilidade urbana e o efeito que podem ter no desenvolvimento sustentável de uma região e na melhoria da qualidade de vida da sua população.
E isto vale tanto para uma das cidades mais concorridas do Mundo, como para um município de pequena ou média dimensão em Portugal.
Uma cidade com ambição de futuro precisa de soluções de mobilidade activa para peões e ciclistas, mas também de alternativas para a fácil movimentação de residentes, trabalhadores e visitantes.
Tem de criar uma rede de transportes públicos eficaz entre o núcleo urbano e as periferias, não só nos dias úteis, mas também aos feriados e fins-de-semana, e à noite. Depois, é fundamental que as pessoas a usem.
A semana passada, entrou em funcionamento o alargamento dos horários do Mobilis, em Leiria, com o reforço nocturno em algumas linhas e a circulação de autocarros também aos sábados, domingos e feriados.
A necessidade do novo serviço vinha sendo reivindicada há muito e motivou até a entrega de uma petição na Câmara Municipal, assinada por cerca de um milhar de subscritores.
Porém, no último fim-de-semana, e apesar da animação natalícia ter atraído milhares de pessoas ao centro da cidade, a utilização deste sistema de transporte público terá ficado muito aquém do que seria expectável.
E, sem passageiros, contra factos, não há argumentos.