Opinião

Voltar para dentro

10 nov 2016 00:00

Há qualquer coisa nas cores fortes e gastas com que metade da natureza se pinta, que nos cai na alma como um lago, nos aquieta de frenesins anteriores e nos faz parar um pouco, antes de recomeçarmos tudo, outra vez.

Chega o tempo de Outono e com ele a intimidade que o Verão dispensa. Há qualquer coisa na luz quebrada dos dias que nos fala ao ouvido, que nos pede momentos de silêncios em volta de minudências, em volta de pensamentos vagabundos, em volta de pedaços um pouco perdidos de nós. Há qualquer coisa nas cores fortes e gastas com que metade da natureza se pinta, que nos cai na alma como um lago, nos aquieta de frenesins anteriores e nos faz parar um pouco, antes de recomeçarmos tudo, outra vez.

E a outra metade, rente ao chão, tornada súbita e exuberantemente verde, estende-se, escorre, conquista espaços, recobre pedras e ramos, e guarda a luz, na infinita promessa do que acontecerá em tempo próprio, quando tudo tiver já reencontrado o lugar que ocupa e o sentido que lhe pertence.

O tempo de Outono é um lugar aberto à consciência de nós, percebida no sossego dos silêncios em que o olhar pousa. Nós, reconhecendo-nos num ciclo de fim e recomeço e tornados talvez por isso mais humanos e mais próximos do que somos; nós, sentindo-nos pertencer a uma história que, não tendo ainda um final, ganha mais um ponto e vírgula aqui.

*Professora de dança

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