Sociedade

Animais terapeutas abrem sorrisos e semeiam afectos

2 out 2020 15:20

Em Leiria, cães e cavalos são utilizados por psicólogos, terapeutas da fala e psicomotricistas, entre outros profissionais da saúde, para acompanhar crianças, jovens e adultos, com ganhos que os estudos científicos começam a confirmar

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Sessão de terapia assistida por animais na APPC-Leiria
Ricardo Graça

Nos dias do núcleo de Leiria da Associação Portuguesa de Paralisia Cerebral (APPC), as cadelas Lua e Salsa, duas labradoras, são presença obrigatória. Na sessão em que o JORNAL DE LEIRIA se intromete, Lua é a terapeuta de serviço, a auxiliar a psicomotricista Ana Fragoso. Há uma menina de quatro anos no centro dos acontecimentos , que aproveita a objectiva da máquina fotográfica para exibir proeza atrás de proeza. Sempre em interacção com a amiga Lua. Exercícios rápidos com cores, bolas, percursos – e biscoitos de recompensa, claro – que permitem trabalhar a linguagem, a lógica, o raciocínio, a motricidade física, o equilíbrio ou a estimulação sensorial, entre outros ângulos do desenvolvimento.

Dos problemas neurológicos e psicocomo tores mais desafiantes aos medos e desequilíbrios mais comuns, passando pelo autismo, a terapia assistida por animais tem-se revelado uma resposta útil, também em Leiria, onde a terapeuta Ana Fragoso acompanha crianças e jovens há vários anos, em diferentes contextos, com o apoio de cães e cavalos. Um caso que recorda com intensidade também tem como protagonista a cadela Lua, que se tornou a companheira especial de um menino portador de síndrome raro que manifestava pânico de canídeos e depois de algumas sessões acabou a passear a Lua na rua e a dar-lhe comida na mão.

Animais que curam, ou, pelo menos, assumem o papel de co-terapeutas e facilitam momentos positivos na abordagem terapêutica, são, no entanto, raros em Portugal. A associação de referência no sector, a Ânimas, certificou 83 duplas até à data, nem todas no activo. O vazio que resulta da inexistência de legislação específica atrasa a expansão de uma actividade com evidências científicas reportadas em diversos estudos, sobretudo no estrangeiro.

Vários saberes

No núcleo de Leiria da APPC, o programa de terapia assistida por animais coloca a terapeuta Ana Fragoso e as cadelas Lua e Salsa a trabalhar em equipas multidisciplinares que incluem psicologia, terapia ocupacional, fisioterapia e terapia da fala.

Ana Fragoso e a cadela Lua

Especialista em reabilitação psicomotora e licenciada pela Faculdade de Motricidade Humana da Universidade de Lisboa, Ana Fragoso identifica na terapia assistida por animais benefícios ao nível da comunicação, do controlo das emoções, da auto-confiança e da interacção com o outro. “O vínculo é a base e é muito mais fácil” ser estabelecido com o patudo do que com o terapeuta, porque o afecto surge naturalmente, explica ao JORNAL DE LEIRIA. O estágio num centro hípico em Lisboa com aulas de equitação terapêutica, no último ano da licenciatura, deu-lhe a conhecer uma abordagem que nunca mais quis abandonar no percurso profissional. “Pude ver que os objectivos colocados eram muito ricos” e “todos os utentes estavam supermotivados”.

Alguns exercícios que utiliza para promover a auto-estima centram-se no controlo da acção e do movimento dos cães através de comandos básicos como sentar ou deitar, o que confere aos utentes da APPCLeiria uma sensação de controlo e realização, num contexto lúdico, em que operam o planeamento de tarefas, a redução da ansiedade e a organização de percursos, por exemplo.

Cães brancos e cavalos dóceis

Quanto aos cães, que são treinados, não há um perfil fechado à partida, mas, segundo Ana Fragoso, “os cães brancos e labradores tendencialmente são mais propícios a terem competências” para co-terapeutas, pelas características da raça e pela reactividade das crianças perante tonalidades mais claras, embora, no final, o factor decisivo, afirma, seja “o temperamento do animal”. Gatos e roedores são usados, mas os mais comuns são os cães e os cavalos.

Na Quinta Vale do Lena, na Azóia, a psicomotricista está integrada no programa de equitação terapêutica, indicado para crianças, jovens e adultos com dificuldades a nível psicomotor, emocional, relacional e de comunicação. E explica as mais-valias no desenvolvimento do equilíbrio e da coordenação motora: "No passo, o movimento é tridimensional e faz com que o cavaleiro quando está lá em cima receba a informação que reproduz a marcha humana”.

Ana Fragoso integra também a equipa da clínica Alcance em Leiria, onde recebe com frequência casos de crianças e adolescentes que manifestam instabilidade no ambiente familiar ou na escola, com agitação motora e dificuldades de autoregulação. Independentemente do contexto, garante que é na terapia assistida por animais que observa resultados mais imediatos: “É aquilo que mais prazer me dá e em que sinto que o meu trabalho faz ma

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