Economia
Apoio histórico à economia deixa muitas empresas de fora
Mário Centeno anuncia resposta sem precedentes: para já, 9.200 milhões de euros. Fora o lay-off, não há ajudas para trabalhadores por conta de outrem em casa sem produzir
Ao contrário da crise de 2008, que começou no sector financeiro e depois contaminou as empresas, os efeitos da pandemia de Covid-19 sentem-se primeiro no consumo e na produção. Pressionam a tesouraria e ameaçam o rendimento das famílias. Para evitar o pior cenário, já existem medidas de alívio anunciadas. Os ministros das Finanças e da Economia avançaram ontem, pela manhã, com mais um pacote de apoio à liquidez, que combina linhas de crédito com moratórias de empréstimos e adiamento de imposto e contribuições para a Segurança Social. Vale 9.200 milhões de euros. Mário Centeno diz que “circun tâncias excepcionais” exigem “uma resposta sem precedentes” e reconhece que o abrandamento provocado pelo novo coronavírus “está a levar a economia a tempos de guerra”.
Os mais de 9 mil milhões de euros prometidos pelo Governo destinam-se a empresas e trabalhadores independentes, assim: linhas de crédito com período de carência até ao final de 2020, a amortizar em quatro anos (3.000 milhões de euros), flexibilização de impostos (5.200 milhões de euros) e contribuições para a Segurança Social (1.000 milhões). Mas há condições. Nesta fase são abrangidos o turismo, a restauração e similares, as indústrias extractivas e as indústrias do têxtil, vestuário, calçado e madeira. Negócios com volume superior a 10 milhões de euros no caso dos impostos e mais de 50 trabalhadores no que se refere a contribuições para a Segurança Social só têm acesso se apresentarem uma quebra de 20% na média dos três meses anteriores.
Para os restantes sectores da economia, já tinha sido apresentada uma linha de crédito de suporte da tesouraria, no valor de 200 milhões de euros, cujos requisitos de acesso vão ser revistos e flexibilizados, porque também previam uma diminuição substancial das vendas no período precedente.
Na conferência de imprensa de ontem, Mário Centeno assegurou que até ao final do mês de Março será aprovada a legislação que vai permitir às empresas adiar os pagamentos à banca.
O executivo liderado por António Costa avançou medidas de apoio às empresas e aos trabalhadores em três momentos principais: 9 de Março na concertação social, 13 de Março depois do Conselho de Ministros, e ontem, 18 de Março. Até à data, empresas que queiram enviar trabalhadores (não doentes) para casa têm de pagar 100% do salário (com ou sem teletrabalho) e, fora o lay-off, não existe qualquer mecanismo do Estado para ajudar neste cenário.
Trabalhadores em quarentena de 14 dias (mas não infectados) ficam de baixa e recebem 100% da remuneração, se existir atestado do delegado de saúde pública no concelho. Com diagnóstico de Covid-19, a remuneração durante a baixa é cortada para 55% nos primeiros 30 dias.
Para os trabalhadores por conta de outrem em casa a acompanhar os filhos até 12 anos de idade, foi criado um apoio financeiro excepcional no valor de 66% da remuneração base (33% a cargo do empregador, 33% a cargo da Segurança Social), que é de 33% para trabalhadores independentes.
Há ainda um regime de lay-off simplificado para empresas que vejam a sua actividade severamente afectada pela epidemia: os trabalhadores têm direito a 66% do salário ilíquido (30% pelo empregador e 70% pela Segurança Social). Mas este regime só está disponível quando se verifica uma ruptura na cadeia de abastecimento ou uma quebra de 40% de vendas nos últimos três meses por comparação com o período homólogo.
“A maior parte das medidas fazem sentido, são boas, mas muitas delas são dificeis de operacionalizar”, comenta o presidente da Nerlei – Associação Empresarial da Região de Leiria, confiante que há tempo para corrigir, adaptar e acrescentar apoios. António Poças salienta que se “o Estado e as instituições pagarem o que devem às empresas” é uma maneira de pôr dinheiro na economia sem obrigar a endividamento. Desde logo, se forem concluídos “os pagamentos do Portugal 2020 que estão para ser feitos”.
O dirigente alerta para o “risco muito forte” de incumprimento entre as empresas. Logo, as instituções nacionais e internacionais devem focar-se em “ajudar as empresas a conseguirem cumprir compromissos e manterem-se a trabalhar”.
O anterior presidente da direcção da Nerlei, Jorge Santos, lembra que “as pessoas já estão a ficar em casa e não estão a consumir, portanto, vai cair a procura”, e, “ao cair a procura as empresas não vão ter mercado para ve nder os seus produtos , tirando excepções”.
Para responder aos encargos fixos que as empresas suportam, o empresário sugere que as moratórias de créditos e fundos comunitários não sejam registadas como incumprimento. “Já foi feito em 2008 e salvou muitas empresas”, salienta.
Quanto ao lay-off, apresenta “condicionantes grandes demais para uma situação de urgência”, segundo Jorge Santos. Impõe-se “mais agilidade e também supervisão para evitar abusos”.
Nos últimos dias, a preocupação com os impactos económicos causados pelo novo coronavírus começou a mobilizar os vários governos. Espanha anunciou 200 mil milhões de euros, França prometeu 300 mil milhões de euros para os empréstimos bancários das empresas, Itália avançou com 25 mil milhões de euros destinados a famílias e empresas. As respostas estão em constante actualização e serão seguramente ampliadas nas próximas semanas.