Sociedade

Artigo científico afirma que sistema meteorológico “gerou episódios de vento forte” durante incêndios de Pedrogão Grande

22 mar 2022 17:04

Um de dois “mecanismos fundamentais” pode ter influenciado a propagação do fogo

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O incêndio que deflagrou em Junho de 2017 em Pedrógão Grande provocou 66 mortos e mais de 250 feridos
Ricardo Graça/Arquivo
Redacção/Agência Lusa

O sistema meteorológico que se propagou junto de dois incêndios em 17 de junho de 2017, em Pedrógão Grande, “gerou episódios de vento forte”, referiu o artigo científico “Influência de um Sistema Convectivo sobre os Incêndios de Pedrógão Grande”, publicado este mês na revista Atmosphere.

Realizado no âmbito do projecto “FIRESTORM (Weather and Behaviour of Fire Storms)” (“Clima e comportamento das tempestades de fogo” em inglês), o estudo conta com a participação do Instituto Português do Mar e da Atmosfera (IPMA), e da Associação para o Desenvolvimento da Aerodinâmica Industrial, sendo financiado pela Fundação para a Ciência e Tecnologia.

De acordo com a informação do IPMA, “o trabalho procurou explicar a influência que o sistema meteorológico que se propagou nas proximidades de dois incêndios iniciados durante a tarde de 17 de Junho de 2017, em Escalos Fundeiros e Regadas", em Pedrógão Grande, distrito de Leiria, teve na evolução daqueles fogos.

“Verificou-se que o sistema apresentou características particulares e que gerou episódios de vento forte à superfície por meio de dois mecanismos fundamentais, um dos quais terá condicionado a propagação do fogo de modo mais significativo”, relata o artigo.

Segundo o documento, “na fase inicial e madura do sistema ocorreu actividade convectiva na sua secção dianteira, que se traduziu pela ocorrência de trovoada e se revelou prolífica geradora de fenómenos do tipo ‘downburst’”.

“Trata-se de correntes de ar descendente que, neste caso, foram produzidas pelos efeitos combinados da sublimação e fusão de ‘graupel’ e granizo e da evaporação de gotas de água que precipitaram a partir dos núcleos convectivos”, observou, notando que “estes coexistiam com uma massa de ar seco em que o sistema meteorológico se propagava”.

O artigo científico sustentou que “as correntes descendentes associadas a cada um dos núcleos convectivos eram fortes e organizadas, acelerando à medida que se aproximavam do solo e divergindo à proximidade deste, produzindo, então, escoamentos junto à superfície que geraram vento forte, com rajadas”.

Notando que “estes efeitos foram reportados pela população em diversos locais situados a sul da área dos incêndios e também foram observados em estações meteorológicas de superfície”, o artigo ressalvou que “a contínua monitorização das plumas dos incêndios durante estas fases sugeriu, no entanto, que estes fenómenos não terão influenciado os incêndios de modo significativo”.

“Num momento posterior do ciclo de vida do sistema meteorológico, e quando este se encontrava mais próximo dos incêndios, verificou-se a gradual dissipação dos seus núcleos convectivos e o estabelecimento de um conjunto de duas correntes de ar principais”, adiantou.

O artigo científico explicou que se registou, “por um lado, uma corrente de ar ascendente e inclinada, que transportava ar situado adiante do sistema em níveis baixos, para níveis elevados da região posterior do sistema convectivo”.

“Por outro, uma corrente de ar relativamente seco que penetrava pela secção posterior do sistema meteorológico, aos níveis médios, e que o foi atravessando ao longo de extensos volumes atmosféricos ricos em partículas de gelo e gotas de água”, sendo que, “neste processo, esta corrente de ar foi perdendo calor por efeitos de sublimação, fusão e evaporação de hidrometeoros, o que conduziu ao seu progressivo arrefecimento e consequente atitude descendente, com aceleração”.

Esta corrente de ar descendente, “dirigida na direcção dos incêndios, era caracterizada por uma escala espacial maior do que a que havia estado associada a cada um dos referidos ‘downbursts’ e, também, que os seus efeitos foram mais duradouros, tendo influenciado a área em que os incêndios se propagavam, contribuído para antecipar a sua junção e a produção da chamada tempestade de fogo que se lhe seguiu”, acrescentou o artigo divulgado pelo IPMA.

O incêndio que deflagrou em 17 de Junho de 2017 em Pedrógão Grande, distrito de Leiria, e que alastrou a concelhos vizinhos, provocou 66 mortos e mais de 250 feridos, sete dos quais graves, e destruiu meio milhar de casas, 261 das quais habitações permanentes, e 50 empresas.