Sociedade
Crianças põem as mãos na terra e aprendem competências para a vida
Crianças aprenderam a plantar, regar e cuidar de plantas aromáticas, hortícolas, flores comestíveis e morangos

Cerca de dois mil alunos do pré-escolar ao secundário foram desafiados, este ano lectivo, a meter as mãos na terra, para plantar, regar e cuidar de plantas aromáticas, hortícolas, flores comestíveis e morangos, num canteiro instalado pelo município em todas as escolas.
O projecto piloto, em que participa também a Universidade Sénior, pretende ensinar a todas as crianças de onde vêm os alimentos que lhes são servidos nas refeições, de uma forma divertida.
Aluna do 2.º ano na EB1 do Juncal, Alice Agostinho, 7 anos, gosta de regar a horta da escola, onde, por estes dias, já se via um pequeno tomate, ainda verde. “Mas tem de se pôr pouca água, porque as plantas podem morrer”, explica. Com a lição bem estudada, diz que também gostou do sabor do amor-perfeito, cujas folhas foram colocadas nas bolachinhas de aveia com banana, confecionadas pelas crianças.
Ensinar aos mais pequenos que há flores comestíveis é um dos objectivos deste projecto educativo, que pretende, acima de tudo, mostrar-lhes de onde vêm os alimentos que são servidos à mesa.
“Há crianças que pensavam que vinham do supermercado”, conta Rosa Vala, que se inspirou no tema “Agricultura Sustentável – Vamos pôr as mãos na terra”, escolhido este ano pelo município, onde trabalha, para propor o projecto.
“As crianças não sabiam que é preciso terra, água, amor, cuidar e tempo”, assegura Rosa. “E é muito importante perceberem que tudo leva o seu tempo, e saberem as propriedades das plantas aromáticas”, defende.
Aluna do 3.º ano da EB1 do Juncal, Leonor Vicente, 9 anos, confirma que não nota muita diferença nas plantas, cada vez que vai espreitar o canteiro da escola, porque sabe que crescem devagarinho. “As plantas precisam de água para sobreviver. Parece que estou a dar vida aos seres vivos quando as rego”, observa Leonor.
Em casa, também tem uma horta, com alfaces, pepinos, tomates e “outras coisas”, e plantas, duas das quais recebeu na Semana da Educação. “Ponho-lhes um bocadinho de água todos os dias, e, no Verão, ponho mais um bocadinho”, adianta. E acredita que os alimentos plantados nas hortas têm mais qualidade. “Têm um bocadinho de nós”, diz.
Para as crianças que não tinham contacto com hortas, o projecto de agricultura sustentável tem sido uma experiência surpreendente.
“Agora, a maior parte sabe que as pipocas se fazem com milho, mas ao princípio não acreditavam”, assegura Rosa Vala. Para o provar, colocaram uma máquina de fazer pipocas, na Semana da Educação.
A maioria desconhecia, também, que as leguminosas não são apenas um fruto, mas vagens com sementes, à excepção das crianças cujos pais ou avós têm hortas.
É o caso de César Barbeiro, 10 anos, aluno do 4.º ano da EB1 do Juncal. “Tenho uma horta em casa, e, quando o meu pai me pede ajuda, vou lá fechar a torneira e apanhar fruta por baixo da árvore”, explica. “Alfaces quase nunca compramos, e a minha avó dá-nos ovos, porque tem galinhas”, acrescenta.
A avó de Francisco Caetano, 9 anos, também tem um terreno de cultivo. Na escola, o aluno do 3.º ano gosta de “olhar para as plantas e de as cheirar”, sobretudo os morangos. “Vi-os a crescer, a ficarem verdes e depois a começarem a ficar vermelhos”, afirma. “Também gostava de ter uma horta, para não ter de ir às compras.”
Fátima Mendonça, coordenadora da EB1 do Juncal, que tem 90 meninos do 1.º ciclo e 28 do pré-escolar, refere que, no ano lectivo anterior, “os alunos já tinham aprendido a utilizar as ervas aromáticas na alimentação para reduzir o sal”.
Este ano, alargaram os conhecimentos sobre agricultura sustentável, ao cultivar pepinos, amores-perfeitos, alfaces, capuchinhas, morangueiros, tomilho, cebolinho, milho, girassóis, feijão verde, abóbora, beterraba, tomates, cebola, pimento, erva cidreira, salsa e coentros. “Adoram fazer o buraquinho na terra para enfiar a planta lá dentro, põem as etiquetas para as identificar, regam, sacham e arrancam as ervas daninhas”, conta.
“Só tenho pena que haja apenas dois canteiros para tantos alunos, porque se envolvem todos e brigam, porque todos querem plantar e regar”, afirma a coordenadora da EB1 do Juncal. E diz que a quantidade plantada não é suficiente para todas as crianças levarem coisas para casa, o que as deixa tristes.
A confecção de bolachinhas com uma folha de amor-perfeito por cima foi a solução encontrada para todos experimentarem a flor comestível.
Tal como as restantes escolas, têm ainda uma gaiola para pássaros numa árvore, e um hotel de insectos, fundamentais para a polinização. “Sem insectos, não há vida”, assegura Rosa Vala.
A mentora do projecto teve a preocupação de criar canteiros elevados, para que todos pudessem cultivar e tratar das plantas aromáticas, hortícolas e flores comestíveis sem grande esforço. Quando as escolas foram desafiadas a participar no projecto-piloto, aderiram apenas 16. Mas, quando começou a haver partilha de fotografias dos alunos a tratar da horta, as restantes juntaram-se, à excepção do pré-escolar de Alvados, onde não existe espaço para o canteiro, com dois metros de largura e três de comprimento. Contudo, como é uma zona rural, as crianças conhecem estas práticas.
“Os miúdos estão a gostar muito. Adoram meter as mãos na terra, e estão a aprender a ser responsáveis e a encontrar soluções para os problemas, competências que vão aplicar na vida”, acredita Rosa Vala.
No próximo ano lectivo, gostava de instalar um sistema de rega automática nos canteiros, para accionar nas pausas lectivas. “Este ano, não houve esse problema, porque choveu muito, mas uma semana ou duas sem regar é a morte das plantas”, justifica. À excepção do milho e da abóbora, que não necessitam de ser regados na fase final de crescimento. A intenção é também envolver no projecto a comunidade e as famílias.