Viver

Da farmácia à paixão pelas artes

15 jun 2016 00:00

Jorge Gomes: cenógrafo do Sport Império Marinhense

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Daniela Franco Sousa

Passou quase toda a sua vida atrás do balcão, a compor e a vender medicamentos para várias gerações da Marinha Grande. Mas além da simpatia e da bata branca, é muito mais aquilo que define o “Jorge da farmácia”.

Jorge Gomes foi nascer a Coimbra, a 31 de Março de 1947, por recomendação médica. Uma vez que a sua mãe já tinha um historial de complicações associadas a gravidezes anteriores, que não tinha conseguido manter, achou-se mais prudente vigiar o parto no hospital.

O bebé, que nasceu saudável, voltou então com os pais para a Marinha Grande. Jorge teve uma infância “relativamente boa”, tendo em conta as dificuldades vividas por muitas famílias nessa altura.

E embora tivesse apenas quatro anos quando a sua mãe morreu, ao dar à luz um casal de gémeos, Jorge e os irmãos mantiveram, e ainda mantêm, uma óptima relação com a madrasta. Além do trabalho na fábrica, o seu pai também vendia tremoços na praça, para equilibrar o orçamento, recorda Jorge Gomes.

“Eu teria até tido a oportunidade de me formar, mas baldei-me”, admite Jorge, que confessa ter ficado ludibriado com os seus primeiros vencimentos. Feita a quarta classe, o aluno frequentou a Escola Industrial e Comercial da Marinha Grande. Ainda teve aulas no antigo Edifício da Resinagem. Estudou até aquele que seria hoje o 7.º ano de escolaridade.

O problema, reconhece, foi ter tido a oportunidade de trabalhar aos 13 anos. Ainda tentou conciliar trabalho e estudos à noite, mas admite que o empenho não foi suficiente. A escola acabou mesmo por ficar para trás. O seu primeiro emprego foi na Farmácia Gândara, mas o rapaz não ficou por muito tempo.

“Fui despedido porque não ia à missa”, resume Jorge Gomes. Os donos do negócio eram muito católicos e acabaram por preteri-lo por outro colaborador que tinha o hábito de ir à missa, recorda Jorge. Seguiu-se o emprego numa pequena oficina de vidro. Felizmente, no final dos anos 60, abria uma vaga na Farmácia Central.

Jorge foi substituir um rapaz que ia para a tropa e acabou por ficar durante décadas, até se aposentar. Era um trabalho muito desafiante, descreve Jorge. Uma das pessoas com quem mais aprendeu foi José Valada, que sabia muito de manipulados. No início, quase não havia medicamentos embalados, pelo que as misturas eram realizadas artesanalmente.

Desde pílulas a “hóstias” (composições de água e farinha prensada que serviam de invólucro a vários conteúdos), Jorge aprendeu a fazer de tudo um pouco. Dormiu vezes sem conta na farmácia. “Quando comecei a fazer noites, entrava de serviço ao sábado e só saía no sábado seguinte”, lembra Jorge. Ia-se a casa tomar banho e fazer refeições e durante toda a semana passava-se a noite na farmácia, com sonos interrompidos pelos clientes. “Era muito cansativo”, recorda.

O técnico de farmácia começou a namorar cedo, mas sempre disse que não casaria antes de concluir a tropa. Pior do que não voltar de Ultramar, era regressar como um fardo para a viúva e para os filhos, acreditava Jorge.

E assim fez. A namorada, esposa há 43 anos, esperou pelo fim do serviço militar para dar o nó. Jorge cumpriu um ano de tropa em Portugal e, dada a especialidade, de enfermeiro, passou vários meses no Hospital da Estrela, onde assistiu à chegada de jovens militares. Cegos, amputados, paralisados, gente nova da sua idade. Foi um duro embate. Nos dois anos que se seguiram, não foi melhor.

Destacado para Angola, Jorge fazia parte de uma companhia independente, sem batalhão, que era destacada para socorrer em diversos palcos de guerra. 

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