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Hádoc. A Retirada expõe o Afeganistão em conflito nos últimos meses do exército americano na região
Quinta sessão do ciclo de cinema documental Hádoc em Leiria
Parceria JORNAL DE LEIRIA e Hádoc - Festival de Cinema Documental
Texto de Nuno Granja, coordenador e programador do Hádoc
É difícil imaginar uma vida pacífica no território do Afeganistão. Parte importante do que foi a rota da seda, a sua localização geoestratégica continua a atrair a cobiça de diversas potências. As riquezas minerais do subsolo e sobretudo a exploração agrícola formam a base da economia, o que não impede que a exportação mais importante seja porventura a papoila de ópio, o que contribui muito pouco para aliviar a generalidade da população de um estado de severa pobreza económica.
Haverá quem alegue que actualmente a maior exportação do Afeganistão serão mesmo os refugiados, em consequência do continuado estado de conflito que assola o país. Na história recente, e motivados por interesses externos, estes conflitos datam pelo menos ao séc. XIX, com a invasão britânica, seguida da ocupação soviética durante cerca de uma década – a atravessar os anos 1980 – e mais recentemente a intervenção norte-americana, que durou 20 anos e terminou apenas em 2021.
De permeio, diversas guerras civis permitiram aos taliban, fundamentalistas islâmicos ultra-conservadores, deterem actualmente o poder.
A Retirada, brilhante documentário do conceituado cineasta Matthew Heineman foca precisamente o período de nove meses que antecedeu a saída, ou retirada – retrograde, na gíria militar – dos norte-americanos de território afegão, após 20 anos de guerra.
Neste filme acutilante e perturbadoramente intenso, acompanha-se uma das últimas unidades das forças especiais dos Estados Unidos enviadas para o Afeganistão, bem como se contacta com a perspectiva de um jovem general do exército afegão, treinado pelos americanos e empenhado em defender o seu país.
Transversal à violência e caos revela-se e expõe-se, ainda, o desespero e sofrimentos dos civis que tentam, por todos os meios, escapar do colapso eminente, com a subida ao poder dos taliban.
Para quem acompanha o cinema documental, Mathew Heineman é tudo menos um desconhecido. Amplamente premiado (enquanto realizador e produtor), os seus trabalhos anteriores incluem Cartel Land (que foca o tráfico de droga na fonteira entre os EUA e o México), City of Ghosts (exibido numa edição anterior do hádoc, segue a história de um grupo de jornalistas e ativistas sírios exilados, que expõem as atrocidades cometidas pelo ISIS) e The First Wave (em que o autor filma num hospital nova-iorquino durante os primeiros quatro meses da pandemia de Covid-19).
A coragem e arrojo do cineasta são uma das suas imagens de marca e deixam antever, mais do que qualquer sinopse ou análise, o que esperar de A Retirada.
A Retirada
De Mathew Heineman
Retrograde | 94 min | EUA | 2022 | m/12
30 de Maio, Teatro Miguel Franco, Leiria, 21h30
* DOC NYC 2022 – Prémio Melhor Filme
* Telluride Film Festival 2022 – Seleção Oficial
* Critiscs Choice Documentary Awards 2022 - Nomeado Melhor Documentário Político