Desporto
Jogos Olímpicos: mais rápido, mais alto, mais forte e agora também mais digno e mais seguro
Afinal de contas, Tóquio’2020 vai ser, se tudo correr bem, Tóquio’2021. Tendo em conta o momento que o planeta vive, todos concordam com a mudança, apesar de alguma frustração
Há quatro anos, no Rio de Janeiro, a carreira desportiva de Irina Rodrigues sofreu o revés maior. Em vésperas de entrar em acção na prova de lançamento do disco dos Jogos Olímpicos, um acidente no ginásio da aldeia olímpica fez-lhe perder a prova para a qual tinha treinado durante os últimos 1.400 dias. A partir dali só teve um objectivo em mente. Regressar, ainda mais forte, na edição de 2020, em Tóquio. Vai ter, no entanto, de esperar.
Após algum tempo de incerteza, Shinzo Abe, primeiro-ministro do Japão, anunciou na terça-feira que os Jogos Olímpicos, com início previsto para 24 de Julho, vão ser adiados. “Propus o adiamento por cerca de um ano e o presidente [do Comité Olímpico Internacional] Thomas Bach concordou a 100 %”, explicou aos jornalistas.
O COI, por sua vez, emitiu um comunicado dando conta da reunião, tendo ficado definido o adiamento “para lá de 2020, mas não mais tarde do que o Verão de 2021 de modo a salvaguardar a saúde dos atletas e de todos os envolvidos na organização dos Jogos”. “Foi ponderado o efeito da pandemia na vida de todas as pessoas e o significativo impacto na preparação dos atletas para os Jogos», refere o documento.
Irina Rodrigues não ficou particularmente surpreendida com a notícia. Países como o Canadá e a Austrália já tinham garantido que não levariam atletas à maior competição desportiva do planeta se a datasse não fosse alterada. A sensação é agridoce para quem pôs o curso de Medicina em suspenso e se apresentava “em boa forma”.
"Os atletas estavam a ficar em estado de esgotamento por terem e quererem treinar e não haver qualquer tipo de disponibilidade de espaços para o fazer. Na natação, sendo um espaço fechado ainda era mais complicado”
“Não posso esconder que estou um pouco triste. Desde que parti a perna que o meu único objectivo era ir a Tóquio para poder ter uma experiência que não vivi em 2012, por estar muito assoberbada, e em 2016, por causa da lesão. Mas a minha vida sempre foi de luta e isto só significa que vou ter de lutar mais um ano”, assume a lançadora de Leiria, de 29 anos.
Ainda assim, concorda em absoluto com a decisão. “Não é de todo seguro juntar pessoas de todo o mundo numa altura de pandemia”, sublinha a atleta do Sporting. Considera também que os desportistas não estão, neste momento, em pé de igualdade. “Apesar de conseguir estar a fazer algum exercício, não é o ideal, mas conheço pessoas que têm condições para treinar normalmente e outras que não conseguem de todo. Acaba, por isso, por ser o mais justo.”
Oportunidades iguais
No distrito de Leiria, há dois atletas que tinham o passaporte garantido. Evelise Veiga irá representar Portugal no triplo salto e Filipe Gomes o Malawi na natação. Ambos os treinador estão de acordo com o adiamento. “Sou a favor de uma nova, bem mais para a frente, mas para quando tenho muitas dúvidas. Com os devidos contratempos, até os atletas estavam a ficar em estado de esgotamento por terem e quererem treinar e não haver qualquer tipo de disponibilidade de espaços para o fazer. Na natação, sendo um espaço fechado ainda era mais complicado”, realça João Paulo Fróis, treinador de Filipe.
Teme, contudo, que daqui a um ano as condições já não sejam as mesmas. “Será difícil manter um jovem que agora começa a trabalhar e quer ganhar o seu dinheiro. O tempo vai ser cada vez mais curto para uma participação, como teve no mês passado, em duas competições que fez em África.”
Também Cátia Ferreira, treinadora de Evelise, concorda “em absoluto”, com o adiamento e só espera que a federação internacional “seja justa” perante todos os necessários que se podem apresentar. “Era inevitável. Tóquio era um grande sonho, para o qual trabalhamos muito e estávamos a apostar seriamente. Apenas ficou agora um pouco mais longe, por motivos de força maior. Vejo isto como uma oportunidade para melhoramos a nossa preparação que também foi bastante condicionada com a ausência de pista no estádio.”
Além de Irina Rodrigues, no disco, também João Pereira, João Silva e Melanie Santos estavam em lugar de qualificação olímpica no triatlo. Victoria Kaminskaya estava a 14 centésimos de assegurar o lugar na natação e a Pedro Portela faltavam três jogos de apuramento para uma inédita presença de Portugal nos Jogos Olímpicos.
Estava previsto serem em Abril, em Paris, e entretanto foram mudados para Junho. Agora fica um ponto de interrogação, mas o ponta-direta concorda com o adiamento. “Depois desta pausa, dure quanto durar, os jogadores não vão estar na melhor condição física. É muito tempo sem contacto com a bola a treinar individualmente, sem preparação técnica e táctica. Para que o espectáculo seja melhor e pela saúde de todos, vemo-nos em 2021.”