Sociedade
Moradores do Bairro da Integração contestam construção de muro
Obra polémica em Leiria. Famílias dizem sentir-se como reclusos
Quando regressaram ao Bairro da Integração, depois de obras que, de acordo com o Município, envolveram colocação de infraestruturas, e, nas habitações, a substituição de cobertura, caixilharia, piso, pintura e instalação de novo mobiliário, nomeadamente, de cozinha e WC, as famílias encontraram, também, um muro, com metro e noventa de altura, que separa as casas – ou parte delas, pelo menos – de um terreno não urbanizado.
O caso fez a manchete do Jornal de Notícias na quarta-feira, 20 de Novembro, e já obrigou a Câmara de Leiria a reagir através de comunicado.
No número 2, onde vivem Tamara Ezequiel e Alexis Miguel, não há como ignorar a barreira: “Só queria abrir a janela e não ver isto. A gente sente-se animais aqui”.
Implantadas nas traseiras do antigo ferro velho da Rua Paulo VI, as 18 casas do Bairro da Integração estão dispostas em degraus, num declive. O muro foi construído na zona mais baixa. De um lado, há árvores e mato; do outro, uma estrada de sentido único, um passeio e a primeira linha de habitações.
“Se houver aqui, Deus queira que não, um acidente ou um fogo, as ambulâncias não passam. Uma carrinha que veio descarregar bateu ali. Isto é o muro de Berlim”, lamenta Júlio da Conceição.
Os moradores criticam, entretanto, a circulação de veículos à volta das casas, só com um ponto de entrada e saída, que transforma o Bairro da Integração numa espécie de rotunda, explica Alexis Miguel. “Numa situação de afronta, com os carros todos a quererem sair, a gente não vai conseguir sair, de maneira nenhuma”.
Ao Jornal de Notícias, a vereadora Ana Valentim, do Município de Leiria, deu conta de planos para pintar o muro, o que não parece suficiente para calar a indignação. “A gente não queria arte, queria espaço. A gente tem crianças que também fazem grafites”, resume Tamara Ezequiel, queixando-se de que os mais novos jogam e correm na estrada por falta de áreas para brincar ao ar livre.
Em vez de tintas, Alexis Miguel propõe algo diferente: “A solução para isto é o muro chegar para lá ou ir abaixo completamente, porque assim não temos vista, não temos nada, estamos fechados”.
De acordo com o Município, no Bairro da Integração, onde vivem famílias de etnia cigana, foi feito pela Câmara um investimento superior a 500 mil euros, com apoio de fundos comunitários.
Deputados de vários partidos políticos manifestaram intenção de conhecer o local. Ricardo Vicente e Beatriz Dias, do Bloco de Esquerda, anunciaram hoje (21 de Novembro) uma visita a decorrer na próxima segunda-feira, 25 de Novembro.
Câmara: Muro “não isola” pessoas, mas protege
A Câmara de Leiria alega que “o muro não isola pessoas”, até porque que “não existem vivendas do outro lado” e foi construído “apenas numa lateral e no tardoz” do bairro.
Em comunicado, a autarquia explica que a edificação do muro pretende estabelecer “protecção em relação ao terreno florestal, nomeadamente face ao risco e histórico de incêndios florestais naquela zona”, de forma a “oferecer maior segurança e protecção” ao bairro.
A Câmara alega também que a execução do muro “constituía uma obrigatoriedade da candidatura ao PEDU [Plano Estratégico de Desenvolvimento Urbano]”, programa que co-financiou as obras de requalificação do bairro, para “oferecer condições dignas de vida aos moradores, que antes não tinham”.
Entretanto, os deputados do PSD na Assembleia da República eleitos por Leira já pediram esclarecimentos à autarquia, questionando sobre as razões que motivaram a construção do muro e se a definição dos limites do terreno não poderia ser feita de outra maneira.
* com Anabela Silva.