Abertura
Refugiados: Testemunhos de quem encontrou um porto seguro na nossa região
O distrito de Leiria recebeu 93 refugiados oriundos de diferentes países onde se vivem crises humanitárias. Na região encontraram pessoas “muito boas”, que os acolheram de braços abertos.
Fugiram da guerra, da morte e da violência gratuita. Perderam familiares e meteram-se num barco sem condições à procura de paz e de um futuro para si e para os seus filhos.
Depois de passarem tormentas encontraram, finalmente, um porto seguro na região e assumem que foram adoptados por um novo país. Elogiam a forma como foram recebidos e afirmam que a integração foi plena.
Trabalham, são autónomos financeiramente, dentro do possível, e querem construir um futuro na nova pátria. O próximo passo é obter o cartão de cidadão português.
Tahani Sawsan vive na Batalha com o marido e quatro filhos, dois dos quais já nasceram em Portugal. Na porta ao lado está a família do irmão e ainda a avó. Agora são 15. Uma antiga escola primária em São Mamede acolhe-os.
“A família cresceu e a Câmara vai fazer obras de ampliação”, afirma Liliana Moniz, vereadora do Município da Batalha, que, desde o dia 4 de Abril de 2016, apoia este grupo de palestinianos
“Nunca vou esquecer esse dia. Quando cheguei a Portugal tudo estava calmo. As pessoas foram muito simpáticas. Quero agradecer ao presidente e à vereadora que nos ajudaram muito”, afirma Tahani Sawsan, no seu português com algumas falhas.
O marido está a trabalhar, as crianças mais velhas estudam. Com 12 e 14 anos, os jovens já assumiram o português entre eles, algo que nem sempre agrada à mãe.
“Quero que também falem árabe”, afirma Tahani Sawsan, que, para já, é doméstica, mas ambiciona trabalhar “assim que os mais pequenos forem para a escola”.
O passado desta família é de tristeza e violência.
Alguns familiares morreram, outros saíram da Palestina e da Líbia, onde o irmão de Tahani Sawsan chegou a ser raptado, durante dois dias, por ter um cabeleireiro de homens e “os talibãs quererem homens de barba comprida”, conta.
“Os homens não podiam fumar um cigarro na rua e as mulheres não podiam sequer vestir calças. As escolas estavam fechadas. Só existiam as do Daesh, onde nem leccionavam matemática. Sem emprego, havia muitos roubos e nem sequer havia polícia”, lembra a refugiada.
Muçulmanos de religião, esta família foi recebida duas vezes pelo papa Francisco. Primeiro quando se encontraram no campo de refugiados e depois em Fátima.
“Somos todos iguais. Todos somos pessoas e só existe um Deus”, constata, demonstrando um enorme respeito por qualquer religião. Aliás, completamente contra o fanatismo, Tahani Sawsan proibiu os filhos de irem à escola na Palestina, até porque esse era um lugar de recrutamento para o Daesh.
Assim que tiveram oportunidade pagaram e meteram-se num barco, como tantas vezes nos mostram as imagens que passam na televisão, e fugiram. “Tive muito medo. Tomei um comprimido para dormir na viagem. Sabíamos que se acontecesse alguma coisa ninguém se importaria connosco. Éramos 530 pessoas no barco”, recorda, lamentando ainda o tempo que passou no campo de refugiados, “sem condições”.
Em São Mamede encontrou “paz” e sonha com o futuro dos filhos, que gostaria que pudessem ser engenheiro e médico. Em Portugal, a família já celebrou o casamento do irmão.
Liliana Moniz adianta que a preocupação foi ajudar os oito refugiados iniciais a integrarem-se rapidamente na comunidade. Participaram em festas locais, a idosa passou a frequentar um centro de dia e as crianças foram inscritas na escola.
Seis anos depois, a família já tem vários amigos portugueses e garante que não quer sair de Portugal. “Obrigada”, não se cansa de dizer Tahani Sawsan, que assume que, apesar de tentar aprender a falar português cada vez melhor, não quer esquecer a língua materna, que fala em casa.
A avó afirma em árabe: “quero morrer aqui”, traduz Tahani Sawsan, recordando que a idosa fez a viagem de barco com mais de 80 anos. Voltar para o Médio Oriente está completamente fora de questão. Talvez se for de visita e só quando a guerra acabar.
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