Sociedade

Trabalhar depois dos 75 anos, com a motivação de sempre

6 jun 2019 00:00

Histórias de vida | Parar é palavra que se recusam a pôr em prática. Têm mais de 75 anos e continuam no activo, a exercer as suas profissões de sempre. O gosto pelo trabalho e pelo contacto com pessoas é o combustível que os alimenta

FOTO: Ricardo Graça
Joaquim Cunha
Joaquim Cunha
Joaquim Cunha
Lima Bastos
Lima Bastos
Lima Bastos
Francisco Frazão
Francisco Frazão
Francisco Frazão
Joaquim João Pereira
Joaquim João Pereira
Joaquim João Pereira
Olímpio Caseiro
Olímpio Caseiro
Olímpio Caseiro
Maria Anabela Silva

Já ultrapassaram os 75 anos, mas continuam no activo e nem querem ouvir falar em parar. É o caso de Maria de Lurdes Graça, a alma do restaurante Manjar do Marquês, de Joaquim João Pereira, advogado e provedor da Misericórdia da Marinha Grande, de Lima Bastos, médico dermatologista, de Olímpio Caseiro, presidente do Conselho de Administração da Vipex, de Joaquim Cunha, lojista em Leiria, e de Francisco Frazão, comerciante na Batalha.

Entre as principais motivações para se manterem no activo apontam o gosto pelo trabalho e pelo contacto com as pessoas. Admitem ainda que, quando se tem uma vida tão preenchida, é difícil parar, sobretudo, quando ainda há energia e sonhos por cumprir.

Lurdes Graça: A alma do Manjar do Marquês
Porte elegante, cabelo irrepreensivelmente apanhado, sorriso fácil e uma genica difícil de acompanhar. Maria de Lurdes Graça continua a ser, aos 87 anos, a alma do Manjar do Marquês, dividindo a gestão deste afamado restaurante de Pombal com o filho, Paulo Graça, tal como durante décadas fez com o marido, Evangelista Nunes da Graça: “Cada um com o seu pelouro”. O de Maria de Lurdes é a cozinha.

Acorda por volta das 6:30 horas e vê as notícias, porque gosta de “saber o que se passa no mundo”. Chega ao restaurante entre as 9 e as 9:30 horas, já com encomendas feitas, e fica até por volta das 23 horas, apenas com uma interrupção de uma ou duas horas, antes do jantar.
Uma pausa que começou a fazer depois de uma operação à coluna, há sete anos. “Tenho os ossos numa desgraça, mas ignoro as dores. Não me rendo”, afiança, contando que a família “já desistiu” de lhe pedir para parar.

“Às vezes, quando me sentem mais cansada, pedem-me para ir descansar, mas sem sucesso”, admite, confessando que nem mesmo o susto que apanhou há alguns anos com o coração – para esta quarta-feira tinha marcada a colocação do segundo pacemaker – a fez abrandar.

 Até há pouco tempo, não tinha um único dia de descanso semanal e, nos únicos 15 dias que a casa fechava para férias, permanecia ao lado dos colaboradores, para as limpezas gerais.
Hoje, o restaurante encerra à quarta -feira e Maria de Lurdes respeita a pausa. Aproveita para passear ou almoçar fora com o filho ou com amigas. “Em casa é que não fico. Tenho de ver movimento. De falar e estar com pessoas”, conta.

É também o dia que aproveita para se dedicar aos bordados ou a escrever poesia. Fora isso, só tem tempo para “ir ao cabeleireiro, ao calista e ao cemitério”. “Casei com esta casa”, afirma, com um sorriso, Maria de Lurdes, que entrou no mundo da restauração “por amor a um homem”, Evangelista Nunes Graça, com quem casou aos 28 anos, depois de um longo namoro à distância.

Foi por ele que deixou “uma vida de princesa” em Lisboa. Largou um “bom emprego” na Companhia dos Telefones, as matinés de cinema, as amigas e a família, e mudou-se para Pombal que, em 1960, era “pouco mais do que uma aldeia”, para se ligar ao seu amor de sempre e abraçar o negócio da restauração.

Primeiro com a exploração da Pensão Pombalense, depois com o bar das bombas da Shell, um espaço que rapidamente se tornou pequeno. Acabaria por convencer o marido a apostar numa casa de raiz e, em 1986, era inaugurado o Manjar do Marquês, conhecido pelos seus pastéis de bacalhau, panados e bacalhau frito, acompanhados pelo inigualável arroz de tomate, que Maria de Lurdes continua a confeccionar com o carinho de sempre. “Cozinhar é a minha paixão. Vou fazê-lo até que Deus me deixe.”

Lima Bastos: Médico licenciado em filosofia depois dos 70
A resposta sai-lhe rápida: “Continuo a trabalhar porque gosto do que faço, porque gosto de trabalhar e de falar com as pessoas e pelo proveito económico que tiro da minha actividade, que me permite ajudar a família”.

A caminho dos 78 anos, Ângelo Lima Bastos, médico dermatologista, nunca pensou passar à inactividade, embora tenha abrandado o ritmo. Aposentou-se da função pública aos 66 anos, ao fim de 36 anos de carreira, deixando de exercer no Centro Hospitalar de Leiria, que durante um quarto de século, foi a sua casa.

Mas continuou a trabalhar no privado, primeiro na clínica que montou há mais de 30 anos em Leiria e que fechou no final do ano passado, e mais recentemente na Clínica das Olhalvas, onde dá consultas três tardes por semana. “Foi sempre o que fiz no privado”, conta, reconhecendo que a diminuição da actividade após a aposentação mexeu consigo.

“Nos primeiros tempos, quando passava na rotunda junto ao hospital, ficava comovido. A consciência de que nunca mais voltaria a uma casa onde fui tão feliz tocava-me”, confessa o médico, que admite que esse foi um dos motivos que o levou a matricular-se no curso de Filosofia, após a aposentação.

Aos 66 anos regressou aos bancos da Universidade de Coimbra para cumprir o sonho de se licenciar em Filosofia, concretizado já depois dos 70. “Sou médico, porque o meu pai, que também era médico, me pediu e eu fiz-lhe a vontade. E gosto muito do que faço. Mas, a Filosofia era um amor antigo. Por outro lado, quando começamos a envelhecer, temos necessidade de pensar e a Filosofia faz pensar.”

Desta segunda passagem pela universidade, onde partilhou as aulas com jovens com idade para serem seus netos, guarda as melhores recordações. “O convívio com a juventude foi muito bom. Não praxei, como já não o tinha feito quando cursei Medicina, mas ia a todos os jantares de curso. Só não bebia tanto como eles”, graceja o médico, nascido em Fiães da Feira, Aveiro.
Viúvo há vários anos, reencontrou o amor, com uma antiga colega do curso de Medicina, que conheceu há mais de 50 anos. “Uma companheira muito boa, de quem gosto muito”, declara-se.

Joaquim Pereira: Aos 80, entre a advocacia e a Misericórdia
O dia de Joaquim João Pereira, advogado e provedor da Misericórdia da Marinha Grande, começa por volta das sete da manhã, hora a que habitualmente se levanta. Faz “cinco minutos de ginástica” e, por volta das 7:45 horas, já está a entrar num dos estabelecimentos da irmandade. Alterna entre um dos dois lares de idosos e o centro

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