Sociedade
Ubuntu: uma filosofia de vida que faz feliz quem provoca a felicidade
No Agrupamento de Escolas da Batalha a filosofia é inspirada no Ubuntu, um modelo que desenvolve competências sócio-emocionais nos alunos, tornando-os melhores pessoas
“Ajudar os outros e tornar o dia dos outros mais feliz é enriquecedor. Ubuntu é ficar feliz ao ver a felicidade dos outros”. Lourenço Matos, aluno do 12.º ano, define assim a filosofia Ubuntu, que há quatro anos está em prática nas escolas da Batalha, depois do director Luís Novais participar numa formação sobre liderança colaborativa.
Há duas semanas, realizou-se a primeira semana Ubuntu no Centro Escolar de Reguengo do Fetal. Foi uma semana de partilhas e de crescimento, cujo momento alto aconteceu na quinta-feira, quando os alunos dos 3.º e 4.º anos receberam a camisola amarela, com a inscrição 466/64. Assente num modelo de liderança servidora e com a inspiração de figuras como Nelson Mandela, Martin Luther King ou Malala, o Ubuntu é uma filosofia de origem africana que se traduz na expressão “Eu Sou porque tu És”.
“Esta filosofia acaba por valorizar o que cada um de nós tem de especial, mas também a importância de usarmos as nossas qualidades e talentos ao serviço dos outros”, explica Maria Coimbra.
Durante a semana Ubuntu, os mais pequenos subiram a bordo desta aventura cumprindo um painel diário: Eu, Eu e o outro, Eu e os desafios, Eu e o Mundo e Eu sirvo. Em cada dia, as crianças foram desafiadas a dar a sua opinião e a escrever o que lhes ia na alma, sem qualquer correcção de erros. “O objectivo era serem eles mesmos”, explica a professora Fernanda Alvega.
Quando se lhes pergunta qual o significado dos números 466/64 que exibem nas t-shirts, a resposta é rápida: “466 é o número da cela de Nelson Mandela” e o “64 é o ano em que foi preso”.
“Ele foi um grande líder servidor”, afirmam os mais novos. O Ubuntu assenta em cinco pilares: auto-confiança, auto-conhecimento, resiliência, liderança servidora e empatia. “Além de conseguir perceber a importância de valorizar o outro, consegui também conhecer parte de mim que nem conhecia, o que também me torna numa melhor pessoa”, assume Lara Sousa.
Melhores pessoas
No 12.º ano, este é o último ano de Lara Sousa, Lourenço Matos, Matilde Ruivo e Maria Coimbra no clube Ubuntu da Batalha, mas, não têm dúvidas de que esta filosofia os tornou “pessoas melhores” e que “vai sempre haver Ubuntu dentro de nós”. “Damos a nossa parte especial em prol dos outros e estamos dispostos a servir os outros”, acrescenta Matilde Ruivo.
Lourenço Matos revela que muitas das actividades são “apenas pequenos gestos”, mas que “fazem muita diferença”. Pode ser um miminho. Maria Coimbra exemplifica com a oferta de um “simples lápis” com que presentearam os docentes no Dia Internacional do Professor. “Isto explica muito bem a base de todas as actividades Ubuntu”, sublinha.
A gratidão, demonstrando ao outro o quanto importa, e o elogio aos outros são também desígnios para garantir a felicidade do próximo. Sentado na sua cadeira de rodas, o sorriso de João Carvalho, no 4.º ano, evidencia a felicidade que sente ao ver a alegria de todos os seus colegas, que se estão agora a iniciar no Ubuntu.
A criança entrou no programa no ano passado, mas todo o processo que passou na luta contra um cancro - que o colocou numa cadeira de rodas -, impediu-o de realizar muitas das actividades presenciais.
João Carvalho encarna totalmente a filosofia do Ubuntu: “é ser um líder, dar o exemplo aos outros e nunca desistir”, afirma, ao garantir que está “sempre disponível para o outro”, tal e qual um líder servidor.
“Ser Ubuntu é superar todos os obstáculos, partir muros e construir pontes. Somos uma equipa e onde vai um, vão todos.”
Para Carlota Repolho, 3.º ano, receber a camisola Ubuntu foi o dia “mais especial de sempre”. A criança sabe bem a filosofia que pretende seguir: “dar o exemplo, ouvir os outros, falar com o coração e ver com os óculos da empatia.”
O Ubuntu é um projecto de escola, explica Ivania Alexandre, educadora social, ao revelar que “vai ser feito um novo projecto pedagógico da escola, que já vai transparecer esta necessidade de termos uma escola mais relacional e não ser uma escola que olha para o aluno enquanto uma nota, mas enquanto pessoa”.
“Estes alunos desenvolvem competências sócio-emocionais neles e de uma forma colectiva. É a tal interdependência que procuramos cultivar na filosofia Ubuntu”, diz Ivania Alexandre, ao referir que o objectivo é que os alunos saiam do agrupamento a “saber-se relacionar” e “com a ideia de que eu sou porque tu és”.